Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Alunos da USP: departamento estrebucha

Estudantes diagnosticaram em artigo para o jornal Jeca 40, do centro acadêmico da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, o estado terminal do curso de jornalismo. Eis o artigo:



Quando um departamento estrebucha


Daniela Alarcon, Fábio Brandt, Leandro Oliveira, Natalia Guerrero, Renato Brandão, Tadeu Breda, estudantes do curso de jornalismo da Universidade de São Paulo


Estudantes do Departamento de Jornalismo e Editoração decretam estado terminal de seus cursos e planejam ações para acabar com a barbárie


Entrevista marcada, o estudante-quiçá-futuro-jornalista sai a campo: na mão esquerda, o gravador recheado com fita k7 e quatro pilhas grandes; braço direito latejando com o peso da câmera de vídeo super-VHS . Ele tem 15 minutos pra colher o depoimento – a bateria da câmera não dura mais que isso.


Não bastasse a falta de equipamentos, faltam professores, falta debate, faltam disciplinas, falta qualidade no curso de jornalismo da ECA. Longe de serem problemas pontuais, são sintomas de um curso-paciente-terminal, que agoniza desinvestimento, anacronismo e apatia. 


A trajetória do Jornal do Campus é paradigmática dos trancos e barrancos do curso. Produzido pelos alunos de jornalismo, o jornal quinzenal era originalmente bancado pela Reitoria que, dessa forma, reconhecia a importância do veículo na formação dos estudantes e na comunicação da Universidade. Belo dia, o Reitor deixou de rodar o JC. E eis que surge o Jornal da USP, semanal, colorido, com funcionários contratados pela Reitoria. O JC sustentou-se algum tempo às custas de investimento privado; desde que a editora Globo desinteressou-se de seus anúncios em meia página, a impressão do jornal endivida progressivamente o departamento junto à Escola. Saudamos 2006 com uma dívida de R$ 55.610, 60. E que venha 2007?


[Pausa para chorar as pitangas: três anos que a revista-laboratório Babel não é impressa; três câmeras digitais manuais que devem servir às necessidades de todo o departamento. Mês passado, a câmera de vídeo digital quebrou. No laboratório de informática, a impressora matricial geme seus formulários-contínuos. O programa do Júpiter não bate com o conteúdo apresentado que não bate com a aula dada – que é dada se o professor não faltar ou se atrasar, ou ainda, escafeder-se. A lista de optativas eletivas – esquizofrênica, aliás – é tão reduzida que emperra a conclusão do curso. E, se o ensino é violentado diariamente, os dois outros alicerces do tripé acadêmico – pesquisa e extensão – não recebem melhor tratamento.]


Da reforma que nunca existiu


Parte do descontentamento dos estudantes de jornalismo pode ser atribuído às duas últimas tentativas de reforma curricular: falharam. Embora não exista consenso sobre o rumo que o currículo deva tomar, muitos defendem uma reforma bem sucedida como resposta às deficiências da nossa formação.


Há 15 anos, lá atrás, foi constituída uma comissão docente responsável pelo projeto. Nesta proposta, que deveria ser aplicada em 1993, previa-se a especialização em áreas específicas (humanas, exatas, artes, comunicação) por meio de bolsas de optativas e da tutoria docente após a conclusão de 21 disciplinas introdutórias – 12 delas teóricas. Mesmo com apoio dos professores do departamento, esses dois pontos – a base da proposta – nunca foram aplicados rigorosamente. A reforma definhou.


Já na tentativa de 2004, os núcleos de pesquisa foram consultados sobre quais alterações gostariam de ver postas em prática.  Por fim, nem todos os núcleos colaboraram para a construção coletiva e, quando reuniões abertas a estudantes foram chamadas para ratificar ou não o projeto, havia um desequilíbrio no possível currículo, com ênfase nas disciplinas de linguagem. A proposta for recusada. 


Após essas duas tentativas, reformas menores foram implementadas. Pequenas modificações na grade horária. Nascimento e morte de disciplinas. Mas sem a visão de conjunto que caracteriza um currículo; cada núcleo ou professor defendendo aquilo que julgasse mais adequado em nossa formação.


Em nenhuma das situações descritas estudantes e funcionários eram protagonistas. A discussão, quando não era limitada aos professores, levaria à ação apenas com o aval do conselho departamental. O mal-estar entre os estudantes cresceu. E, recentemente, grupos isolados se articulam aos poucos, esperando canalizar esse descontentamento.


Da letargia à ação efetiva


Decepcionados com o curso de jornalismo, estudantes do segundo ano noturno decidiram agir. Questionaram a mediocridade e falta de comprometimento de alguns professores, em disciplinas como Deontologia e História das Doutrinas Políticas e Fundamentos de Economia (ministrada por uma conferencista que pouco freqüentava o curso). No último semestre, os alunos rechaçaram o pacto da picaretagem entre professores-estudantes. Pressionaram o chefe do Departamento, que acabou afastando a conferencista. 


O descaso de professores – que levou os segundo-anistas a constituir um grupo de discussão e trabalho sobre reforma curricular – e a necessidade de trazer ao cotidiano do departamento debates atuais ou relevantes são as duas razões principais que motivaram a organização de uma Semana de Jornalismo no ano passado (após cinco anos sem um evento do tipo) e à construção de uma nova semana neste ano. As atividades da comissão organizadora da semana, contudo, estão parcialmente suspensas. Dado o estado das coisas, o grupo concluiu que manter mesas de debates sobre o jornalismo não é tão relevante, no momento, como discutir os problemas do curso de jornalismo da ECA.


Na quinta-feira, dia 10, a comissão da Semana de Jornalismo agregou-se ao grupo da reforma curricular. Cerca de 40 estudantes, de todos os anos, compareceram à reunião para discutir a necessidade de ações diretas a curto, médio e longo prazo, construindo um curso de jornalismo crítico e de qualidade, inscrito na luta maior por uma universidade pública, gratuita e de qualidade. 


Para mobilizar os estudantes em torno de um objetivo único – ressuscitar o departamento – foi programada uma série de atividades inseridas em uma Contra-Semana de Jornalismo, a ser realizada entre 21 e 25 de agosto – quem sabe um dos primeiros passo para essa ressurreição.


Mais informações sobre a programação da Contra-Semana no endereço http://contrasemanadejornalismo.blogspot.com.’


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Sanfoneiros


Diogo Mainardi propôs na Veja: “Precisamos urgentemente de uma reforma política que proíba o emprego de sanfoneiros na propaganda eleitoral”. Hoje, na Folha, o diretor do Datafolha, Mauro Paulino explica tecnicamente o que Mainardi captou instintivamente: “Tanto xaxado, xote e baião nas campanhas pode ser em vão. O forró é trilha sonora da disputa pela Presidência. As intenções de voto em Lula são 65% no Nordeste, 18 pontos acima de sua média nacional, fato inédito que obriga adversários a disputar esses eleitores para tornar viável o segundo turno. Mas, nas últimas eleições presidenciais, a campanha eletrônica não mudou o voto dos nordestinos”.


Na década de 1980 o Casseta e Planeta (jornal) lançou uma inesquecível campanha contra a ricota. Tinha ricota em tudo: salada, pastel, sopa, talharim, sobremesa. Ninguém agüentava mais. Agora é xaxado, xote e baião. Mas os sanfoneiros continuam competentes e simpáticos. O que estraga a vida deles é o abuso marqueteiro.


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