Você provavelmente ainda não ouviu falar dessa expressão, mas ela é o novo jargão para representar uma sofisticada técnica de disfarçar publicidade como se fosse jornalismo. Tecnicamente a prática é conhecida como Native Ads e está sendo usada largamente pela maioria das agências de publicidade que atuam na internet. [A tradução de Native Ads é um pouco complicada porque o significado da palavra native nesta expressão indica que é algo integralmente associado ao contexto onde é usado, algo difícil ou até impossível de ser identificado e separado.]
O recurso de disfarçar publicidade como se fosse notícia não é novo, pois os publicitários sabem que muitas pessoas desconfiam ou rejeitam tentativas de indução de consumo movidas por interesses comerciais, e por isso tratam de dar ao anúncio uma cara de informação desinteressada. No passado já tivemos as publi-reportagens, que saíram de moda porque o caráter publicitário era demasiado claro. A diferença agora é que a sofisticação no disfarce está alcançando níveis tais que até mesmo os jornalistas já têm dificuldade de dizer o que é ou não é propaganda e marketing.
Agências de publicidade estão lançando páginas Web com a cara, estilo e conteúdo exatamente iguais aos de um veículo jornalístico. Um dos exemplos clássicos é o site BuzzFeed, criado por um publicitário e onde são inseridos textos disfarçados de informação que foram pagos por empresas como a Jet Blue, a operadora de telecomunicações Virgin e a Volkswagen.
O jornal The Washington Post destacou o caso da matéria “14 People Making The Best Of Bad Situations” (14 pessoas fazendo o melhor em situações ruins),publicada no meio das informações jornalísticas, mas que na verdade foi encomendada pela Volkswagen para promover o slogan “Entre e Fique Feliz” (Get In, Get Happy) do seu novo Beetle. O nome da montadora aparece apenas num discreto selinho no início da matéria, sem qualquer indicação de que seja um texto produzido por publicitários.
A publicidade-camaleão é mais um desafio a ser enfrentado pelos profissionais no ambiente online porque a tendência entre os consumidores é culpar os jornalistas quando descobrem que acabaram de ler um anúncio em vez de uma notícia ou uma reportagem. O problema é que, segundo The Washington Post,90% dos leitores não percebem o engodo.
A técnica do anúncio disfarçado tende a crescer porque a concorrência entre as agências de publicidade na internet está se tornando feroz por dois motivos:
1. Como o preço do anúncio online é muito mais barato que o do impresso ou na TV, as agências têm que produzir muito para sobreviver no mercado. Isto significa que a necessidade de diferenciação é uma questão de vida ou morte;
2. A crise dos jornais, revistas e emissoras de TV aberta reduziu drasticamente os seus orçamentos publicitários, fenômeno que é causa e efeito da migração das agências para a internet.
Se, por conta da avalancha informativa na internet, os profissionais e os praticantes do jornalismo já tinham muita dificuldade para separar o boato e a informação falsa da notícia verdadeira, agora ambos são obrigados a colocar sob suspeita até mesmo o material redigido ou filmado conforme os manuais de jornalismo. O preço de equívocos é alto porque compromete a credibilidade, hoje talvez o item mais difícil de ser alcançado e também o mais valorizado na imprensa e na internet. Um profissional pode lutar a vida inteira para conquistar a confiança do público, mas perde tudo instantaneamente caso cometer um erro ou equivoco, mesmo involuntário.
Infelizmente não há hoje nenhum antídoto eficiente contra o anúncio camaleão. A melhor alternativa seria um acordo entre jornalistas e publicitários para banir a prática, mas nas condições atuais do mercado publicitário e diante da guerra por anúncios entre os sites da internet, a tentação para “olhar para o outro lado” será forte demais para ser ignorada.