Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

As ameaças da agroenergia segundo os leitores

Comentários sobre o crescimento da agroenergia no Brasil e no mundo receberam críticas, uma delas ácida, de leitores. Odracir Silva, de São Paulo, reclama que este blogueiro “só pega os clippings de vários lugares e posta aqui’’. E me recomendou uma pesquisa mais séria para verificar se estas fontes de energia são auto-sustentáveis. Segundo ele, o engenheiro Gurgel já alertava no começo do PróAlcool que o programa tinha um déficit de energia. “Até agora ninguém discordou dele’’.


O objetivo deste blog, meu caro Odracir, é justamente o de comentar artigos e análises publicadas pela imprensa (nacional e internacional) sobre o agronegócio. Tenho, portanto, que citar textos publicados na mídia. Sou jornalista e não pesquisador, e embora esteja há 25 anos trabalhando nas áreas de agropecuária, economia e meio ambiente, não tenho a pretensão de “esgotar” ou dar a palavra final sobre nenhum assunto, muito menos sobre os impactos da agropecuária sobre o ambiente e suas relações de sustentabilidade. Questões complexas e polêmicas, por sinal.


Vinte anos atrás, publiquei no Suplemento Agrícola de O Estado de São Paulo várias reportagens denunciando os impactos da expansão da cana em São Paulo, como o aumento da poluição do ar provocado pelas queimadas e a contaminação da água pelo vinhoto. Mas, é preciso reconhecer que de lá para cá as coisas mudaram muito no setor sucro-alcooleiro. Por vários motivos: o crescimento e a forte pressão dos movimentos ambientalistas, as mudanças na legislação ambiental e pelo fato de as próprias usinas, notadamente as de São Paulo, descobrirem as vantagens de utilizar subprodutos como o bagaço e o vinhoto no processo de produção.


Como não sou especialista na área, cito alguns dados do professor José Goldemberg, secretário estadual de Meio Ambiente de São Paulo, em recente entrevista à revista Agroanalysis, da FGV.



1 – Hoje a indústria de etanol é relativamente limpa;


2 – O álcool é um excelente combustível para os motores de ciclo Otto, como os fabricados aqui no Brasil. Ele produz mais tração que a gasolina;


3 – Nos últimos 20 anos, o custo de produção de álcool caiu 3% ao ano no Brasil. É um grande sucesso do ponto de vista econômico. É um programa estratégico para o país, porque reduziu a dependência das importações.


4 – Nos últimos cinco anos, houve uma melhoria efetiva da qualidade do ar em São Paulo. O programa do álcool é um sucesso econômico e ambiental.


5 – O grande problema hoje é saber para onde a cultura da cana vai se expandir. Se ela crescer muito, corre-se o risco de as plantações invadirem áreas ecologicamente inapropriadas, como aconteceu no Pantanal.


Caixa-Preta


O meu amigo e colega Tobias Ferraz, jornalista de Uberaba (MG), também cita Gurgel. “Nas décadas de 1980 e 1990, ele dizia que a conta energética do álcool não fechava porque tinha que usar diesel nos caminhões e tratores das roças de cana, o que ocorre até os dias de hoje. A questão da vinhaça, diz Tobias, vai ser a próxima barreira ao nosso álcool. São milhões de litros de vinhaça produzidos diariamente por uma destilaria.’’


É verdade, Tobias, embora líder mundial da produção de álcool combustível, o Brasil ainda não utiliza combustível limpo e renovável no processo de produção. Na época de safra, as usinas paulistas chegam a consumir entre 15 mil e 25 mil litros de diesel por dia nos canaviais. Há vários projetos, porém, desenvolvidos por grandes indústrias de máquinas agrícolas, para a utilização de biodiesel em tratores e colheitadeiras.


Luiz Antonio Barros da Silva, engenheiro agrônomo, destaca o “vasto passivo ambiental deixado na zona da mata mineira, onde o cultivo da cana não respeitou as leis florestais, comprometendo a função ambiental dessas áreas de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora. Inclusive, vários municípios dessa região (Ubá, Rodeiro, Visconde de Rio Branco) sofrem com escassez de água nos períodos secos do ano, existem graves problemas de erosão, principalmente, na bacia do rio Ubá, em função do uso inadequado do solo por esta atividade. Portanto, devemos refletir profundamente sobre os prós e contras do desenvolvimento dessa atividade.’’


De fato, Luiz Antonio, a expansão da cana não traz apenas oportunidades, como também ameaças. É preciso ter uma legislação ambiental rigorosa não apenas para as usinas e destilarias, para qualquer atividade agrícola ou industrial. E não apenas isto: uma fiscalização constante dos órgãos públicos e da própria sociedade.