Em março, o preço de tabela da publicidade legal na Gazeta Mercantil era de R$ 530 por centímetro/coluna. Cada página tem 312 centímetros/coluna, ou seja, custa, pela tabela, R$ 165.360. Hoje (7/4) o Grupo Eletrobrás publicou 76 páginas de demonstrações contábeis que incluem a Eletrobrás, Furnas, a Chesf (Companhia Hidro Elétrica do São Francisco), Eletronorte, Eletrosul, Eletronuclear, Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE) e Lightpar Participações.
Sem desconto, isso valeria para a Gazeta Mercantil R$ 12.567.360. Com 80% de desconto (será exagero?), vale R$ 2.513.472.
Admitindo-se uma média salarial, na empresa toda, de R 1,5 mil, o que provavelmente é muito, e usando-se um fator de 70% de encargos (o que levaria o salário médio a R$ 2.550), a publicação de um balanço como esse, com esse desconto, daria para pagar, sem se computar outros gastos fixos e variáveis (energia, papel, tinta, rotativa, imóveis, frota de distribuição, etc.), 75 salários por um ano (13 meses idênticos).
É dividir R$ 2.513.472 por 13, o que dá R$ 193.344, e dividir esse resultado por R$ 2.550 (igual a 75,82 salários com encargos; mas não há jornalistas que recebem como “PJ” – pessoa jurídica – na Gazeta Mercantil?)
Tudo isso é especulação. Não tenho as planilhas nem sei fazer essas contas direito.
Vale aqui mostrar como um único evento publicitário desse porte faz diferença na vida de um jornal. Aliás, de dois. A mesma coisa foi publicada no Valor.
Mais duas observações, paciente leitor.
Primeira, que deve ser uma delícia, quase literatura policial, a leitura desses documentos por quem consegue se aprofundar nos números e explicações. Se alguém tiver algo a declarar, peço que se manifeste.
Segunda, o peso que o setor estatal ainda tem no Brasil. Para o bem e para o mal. Para o mal e para bem. Depende da preferência de cada cabeça.
Ver também ‘Balanços, uma obrigação legal‘.
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O leitor Tiago de Jesus fez o seguinte comentário:
‘Por que o artigo se refere inicialmente à Gazeta e menciona o Valor ‘en passant?’
O ‘Midia Kit’ do Valor também está disponível online. Com o mesmo desconto de 80%, com o Valor cobrando R$377,00 por cm/coluna, são outros R$1.787.884,80 para o Valor. Um bom dinheiro, por sinal.
Me pergunto por que a Gazeta Mercantil é um melhor alvo para sugerir pouca ética na relação com estatais.’
Resposta:
1) Obrigado pela informação sobre o Valor. Confesso que não levantei os valores cobrados pelo Valor. Embora o Observatório da Imprensa tenha feito uma assinatura do jornal para mim, tenho a maior dificuldade de usar o site. Tanta, que desisti. Porque cada tentativa toma muito tempo, o recurso mais escasso para mim. No caso da Gazeta, que era o que interessava naquele momento, eu simplesmente telefonei e obtive a informação. Navegar no site da Gazeta também é difícil.
A Gazeta Mercantil tem sido posta sob um escrutínio mais severo desde que passou ao controle do empresário Nelson Tanure, de quem se noticiou que havia adotado como meta ‘extirpar o DNA da Gazeta’ (entrevista de Armenio Guedes em março de 2005). Ou seja, eliminar as características que fizeram da Gazeta o jornal que tinha mais credibilidade no país.
Hoje, segundo informações de boa fonte, houve uma queda muito grande nos critérios editoriais do jornal. Enquanto isso, o Valor, que nasceu de uma jogada conjunta do Globo e da Folha de S. Paulo (ver artigo de Alberto Dines publicado neste Observatório da Imprensa em 2000), avançou em matéria de seriedade e independência.
Essa é a minha explicação. Talvez esteja na hora de se fazer um balanço das trajetórias dos dois jornais de economia.
Em tempo: não se trata de insinuar que há problemas éticos específicos dos jornais na relação com essas estatais. Existe, sim, um dilema comercial/editorial quando se manipulam recursos desse vulto. Mas isso diz respeito ao conjunto da atividade comercial dos meios de comunicação. Aqui dei apenas um exemplo.