Meio que perdida no hipermercado de notícias a varejo da crise da corrupção, uma pensata do deputado mineiro Roberto Brant, do PFL, com a autoridade de quem está há quase 20 anos no Congresso, devia atrair o interesse dos jornalistas capazes de pensar além da edição do dia seguinte.
Produto de uma entrevista informal com ele, o texto “O Parlamento em declínio: uma visão”, saiu ontem na coluna semanal da chefe de redação em Brasília do jornal Valor, Rosângela Bittar.
O artigo contém a matéria prima para uma pauta política de primeira: por que não existe mais no Congresso “um só representante”, como diz Brant, cuja voz a sociedade queira ouvir numa hora de crise?
Onde foram parar políticos da estatura de “Carlos Lacerda, Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Mário Covas” [e outros que ele não citou e que, na direita, centro ou esquerda, iluminavam o trabalho legislativo antes que sobre ele se abatesse a treva da ditadura], “em torno das quais a sociedade podia criar expectativas?”
As perguntas do deputado interessam mais do que os seus ensaios de resposta, sem desmerecê-las. Pois esse é o tipo de questão da qual mesmo o público interessado não costuma se lembrar – e, quando alertado, deve reagir com o clássico “Pôxa, por que não pensei nisso antes?
A quem interessar possa, uma das chaves do enigma pode ser encontrada numa pesquisa do sempre meticuloso cientista político Leôncio Martins Rodrigues, professor emérito da USP e da Unicamp.
Depois de examinar os currículos de várias gerações de parlamentares, ele concluiu com segurança que mudaram muito, desde a redemocratização, o perfil sócio-econômico, a escolaridade e as ocupações prévias dos políticos.
Para usar um termo elitista, de certo modo aconteceu com a política o que aconteceu com o ensino: massificou-se. Não se segue daí, necessariamente, que nas novas classes majoritárias no Congresso haja menos líderes (no sentido com que Brant usa a palavra) do que naquelas que as antecederam, por terem umas e outras extrações diferentes.
Mas em tempos de erosão mundial do respeito dos representados pelos seus representantes e, mais ainda, pelo que fazem em seu nome, aquele pode ser um dado agravante.
No Brasil, com o efeito de aprofundar viciosamente o desrespeito, em reações do tipo: “Eu não vivo dizendo que os políticos não prestam? Pois me aponte um que tenha a dizer agora qualquer coisa que a gente deva ouvir.”
Então, editores de política. Em vez de encher as suas páginas dominicais com entrevistas pingue-pongue que mais consomem espaço do que proporcionam ao leitor a sustança a que têm direito, que tal investir numa apurática para responder por que, nas palavras de Roberto Brant, deputados e senadores deixaram de ser “atores relevantes”?