Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Catanduvas ainda está vazia

Atribuem-se agitações recentes no Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes, onde está o preso Marcola, em parte ao temor de que ele seja transferido para o primeiro presídio federal, em Catanduvas, Paraná. Se fosse crível que presos, ainda mais ligados ao crime organizado, desconheçam o Código de Execuções Penais e a legislação restante que lhes diz respeito – isso ainda não aparece no horizonte, a menos que a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) de São Paulo esteja agindo com primorosa discrição -, se poderia acreditar que eles de fato receiam uma transferência iminente.


Se os presos sabem que não é fácil, nem simples, e talvez nem interesse tanto, em período eleitoral, transferir presos para a prisão federal, os tumultos assumem uma feição “preventiva”. Prenunciam o que poderá ocorrer quando transferências forem efetivamente realizadas. Elas serão, por motivos compreensíveis, sigilosas em todas as suas etapas. Cada uma só poderá ser divulgada quando o preso transferido estiver em sua nova cela. É claro que os outros presos saberão que ele deixou a cela onde estava.


Oitavo dia de presídio vazio


O presídio de Catanduvas foi inaugurado no dia 23 de junho. Hoje é o oitavo dia útil depois de sua abertura oficial e não há lá nenhum preso, ainda. E talvez não vá haver a curto prazo.


No próprio dia da inauguração, o ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, avisou que seriam necessários pelo menos 15 a 20 dias para que uma primeira transferência ocorresse. Até onde se sabe, apenas dois estados, Mato Grosso e Pernambuco, já manifestaram interesse concreto em transferir presos para Catanduvas.


A Assessoria de Comunicação do Ministério da Justiça explica que a transferência de presos é um processo judicial. Primeiro, o diretor da unidade onde está o preso considerado de alta periculosidade faz uma solicitação ao juiz de execuções penais da comarca, que em seguida o encaminha à Primeira Vara Criminal Federal de Curitiba. É nessa instância que será tomada a decisão. (Clique aqui para ler a resolução do Conselho da Justiça Federal que regulamenta o assunto. Arquivo em PDF.)


O Departamento Penitenciário Nacional (Depen) é ouvido apenas quanto à disponibilidade de vagas. No momento, todas as 208 estão disponíveis. Os estados interessados ainda elaboram relações de presos cuja transferência seria recomendável. Há filtros nos procedimentos para evitar que as prisões federais virem válvulas de escape de governos estaduais desejosos de se livrar de presos que estejam dando trabalho sem que sejam de fato indivíduos tão perigosos.


Houve um “salve” político


O depoimento de ontem do ex-secretário da Administração Penitenciária de São Paulo Nagashi Furukawa à CPI do Tráfico de Armas não foi a primeira vez em que ele falou da faceta política da ação do PCC. Em entrevista dada a Bruno Paes Manso no dia de sua demissão (publicada no Estadão de 27/5), Nagashi disse:


“Eles falam nos ´salves´ (comunicados) que distribuem por aí que não querem Alckmin no poder. Querem combater o governador de todo jeito. E nos ´salves´ escrevem que tem de votar no PT. O PT não tem nada a ver com isso. Mas escrevem: temos que votar em Lula para presidente, Marta para governadora e José Claudio Bravos, do PV, para deputado estadual”.


Insista-se no seguinte trecho: “O PT não tem nada a ver com isso”. O partido do presidente Lula não pode, de fato, ser responsabilizado pelo antagonismo entre uma facção criminosa e autoridades que essa facção vê como excessivamente duras, ou injustas, ou opressoras, etc. Mas isso não impede que o PCC imagine que vai se dar melhor com o PT do que se deu com Mario Covas e Geraldo Alckmin.


O grupo faz seus cálculos políticos. Pode ter achado que um governo de Marta Suplicy no estado de São Paulo seria mais leniente, ou menos contundente. É um equívoco. No Brasil, a chamada esquerda se enrola toda com problemas de segurança pública. No passado recente, o marco inaugural dos equívocos foi o primeiro governo de Leonel Brizola (1983-86) no Rio de Janeiro. Não começou com Brizola, claro, mas piorou com Brizola. Houve uma perda gradual de controle. Toda vez que isso acontece acaba, no limite, em massacres.


Um PT que disputa hoje com o PSDB, sofregamente (o advérbio vale para os dois partidos), o voto malufista (e Duda Mendonça não fez campanha para Paulo Maluf e depois para Lula e Marta Suplicy?) pode derrapar e se desmandar na tentativa de colocar um pouco de ordem na bagunça. E isso pode acabar criando para os presos um cenário ainda pior. Seria interessante estudar a situação da segurança pública em Mato Grosso do Sul, no Acre. Onde o PT comanda o Executivo. Lula, como fazia Fernando Henrique, sai de fininho nessa questão. É com os estados, não com o governo federal.


Bandidos fazem política, mas fazem-na sem cabedal político. Eles entendem mesmo é de crime, e de tudo o que o crime envolve ou pode envolver. Por exemplo, telefonia.


Enxergam a política por uma espécie de fresta mental. Na verdade, são muito mais manipulados por políticos do que vice-versa. São manipulados o tempo todo, direta ou indiretamente, no discurso da lei e da ordem, ou na denúncia da ilegalidade e da desordem, ou na rejeição a esses dois discursos. Manipulados com a prestimosa ajuda da mídia, que valoriza mais a busca de audiência do que a busca da verdade.


Não era Marcola


A Polícia paulista acusa o repórter Roberto Cabrini e a Rede Bandeirantes de Televisão de terem divulgado uma entrevista falsa com o suposto líder do PCC Marcola. Como a mídia não gosta de falar da mídia, a notícia, que é um escândalo jornalístico de bom tamanho, foi dada discretamente.


Diadema, Ribeirão Preto, Santo André


Era previsível que a imprensa fosse escarafunchar a vida do prefeito de Diadema, na Grande São Paulo, José de Filippi Júnior, que aceitou ser o tesoureiro da campanha reeleitoral do presidente Lula. “À mulher de César não basta”, etc.


Filippi se defende, o PT o defende. Veremos onde isso chega.


Mas é impressionante a persistência de um padrão. O primeiro coordenador de programa do candidato Lula em 2002 seria o prefeito de Santo André, Celso Daniel. Há acusações de que a Prefeitura de Santo André foi usada pelo PT para fazer finanças. Assassinado em janeiro daquele ano, Celso Daniel foi substituído por outro prefeito, Antonio Palocci, de Ribeirão Preto. Há acusações de que a Prefeitura de Ribeirão Preto foi usada pelo PT para fazer finanças.


Fracassou a montagem do esquema milionário operado por José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e Silvio Pereira. O PT em campanha retrocede aos velhos tempos, sem o antigo entusiasmo da militância, que já vinha se erodindo há pelo menos dez anos.


E chega ao proscênio o prefeito de um dos municípios onde o PT exerce longa hegemonia política.


Se isso não é um padrão, fica difícil dizer o que é um padrão.


Ao jeito alagoano


A IstoÉ acusa o candidato do PTB ao governo de Alagoas, deputado federal João Lyra, de ter mandado comprar todo os 11 mil exemplares da edição desta semana enviados ao estado. Na reportagem de capa, Lyra é acusado por um ex-policial militar de ter tramado a morte, há dez anos, de um funcionário da Secretaria da Fazenda do estado. O deputado nega as duas acusações.



Tuberculoso pode virar faquir


A Folha informa hoje (5/7) que, para escapar das penas da Lei de Responsabilidade Fiscal, a governadora Rosinha Matheus cortou despesas. Isso envolve desde luz apagada durante o dia em repartições até restrições ao uso de celulares por autoridades. No meio, comida em hospitais para tuberculosos estaria sendo racionada. O secretário de Comunicação do Rio de Janeiro, Ricardo Bruno, declarou que o regime de contenção não prejudica o trabalho.


Essa tese deveria ser explorada pela imprensa. Se é verdadeira, indica um caminho válido para eliminar desperdícios no serviço público. Desde que os tuberculosos em tratamento hospitalar não sejam transformados em faquires e outros serviços públicos não sejam jogados às urtigas.


# # #


Outros tópicos recentes deste blog


Erundina quer rever radiodifusão


Raça e pesporrência


Mais quatro canais estatais


Congresso e mídia, relação incestuosa


Em campanha, mais propostas, menos fofocas


O Observatório no interior de Mato Grosso


A antilogística do sistema prisional


Um mês atrás, madrugada de ruas vazias


A curiosa trajetória de Anthony e Rosa


Revista saúda dez anos do OI