Escrevendo no Estado, a analista Fátima Pacheco Jordão atribui o salto da candidata Marta Suplicy no último Ibope – onde aparece com 15 pontos à frente de Geraldo Alkmin – a ela ter respondido “mais convincentemente” às questões que sensibilizam o eleitor e que a imprensa vem destacando.
De fato, em relação a eleições municipais anteriores, a mídia dos grandes centros antecipou e aprofundou este ano a exposição dos problemas das suas cidades.
Não só isso, mas vem cobrando dos candidatos respostas mais substantivas às questões levantadas. Fátima cita o exemplo da Globo, que na semana passada pôs os prefeitáveis paulistanos a discutir assuntos que interessam diretamente à população, como saúde e coleta de lixo.
Decerto graças às próprias pesquisas, emissoras e jornais sabem que é isso que o público quer, incomparavelmente mais do que a cobertura do varejo das campanhas e a reprodução da intrigalhada que faz parte do jogo político.
Mas talvez se trate de algo além disso. Primeiro, nem o mais ácido dos críticos de mídia terá como negar que melhorou o padrão da abordagem jornalística das realidades urbanas, em especial tendo a eleição como pano de fundo.
Cada qual a seu modo, o Estado, a Folha e o Globo, por exemplo, têm gasto papel, tinta e inventividade em profusão para falar das mazelas paulistanas e cariocas, respectivamente.
Em segundo lugar, pode ser que a imprensa não esteja apenas atendendo (bem) à demanda do leitor, mas criando e reforçando essa mesma demanda.
Funcionaria mais ou menos assim. Ao dar seguidamente amplo espaço a um tema, ou variações em torno dele, é como se os meios estivessem dizendo ao público: “Olha aí, isso é importante”.
Os leitores não precisam ler a massa de matérias que encontram nos jornalões sobre as suas cidades. Por si sós, a sua frequência e destaque chamam a atenção para tais assuntos e, de quebra, induzem a que se confira a capacidade dos candidatos de lidar com eles.
Não é que o cidadão não saiba, pelo menos em termos gerais, quais os maiores problemas que o cercam. A diferença é que a imprensa os situa e hierarquiza – como procura fazer com tudo mais que divulga. O resultado, no caso, é uma espécie de legitimação das preocupações do público.
Amanhã, quando lhe pedirem para assinalar o que espera da cobertura da sucessão municipal, o entrevistado estará à vontade para dizer que o jornalismo deve dar prioridade não à disputa política em si, mas aos problemas urbanos e aos projetos dos candidatos a respeito.
Ou seja, o que a imprensa, tendo aprendido com o seu desempenho em eleições passadas, já vem fazendo agora com razoável competência. Os sociólogos mais pedantes chamam isso de “mecanismo de causação circular”.
Para os que valorizam a função do jornalismo como promotor e mediador do debate público, e acham que nesse sentido a imprensa vem fazendo a coisa certa na campanha eleitoral que está aí, melhor falar em “círculo virtuoso”.
P.S.
A partir de hoje, com o início do horário eleitoral, a mídia escrita tem uma incumbência extra: passar o pente fino nas promessas e nos currículos ostentados pelos candidatos – umas, muitas vezes fantasiosas; outros, muitas vezes siliconados. Os jornais já fizeram isso em outras eleições, mas têm muito chão para melhorar.