Este, sabemos, é um blog de observação da imprensa. Mas, com perdão pela obviedade, todo olhar sobre a mídia é também um olhar sobre a realidade que ela retrata – exemplarmente, pavorosamente, ou qualquer coisa entre esses extremos.
Muitas vezes, pelo menos no meu caso, a crítica dos fatos emparelha com a apreciação do material jornalístico a seu respeito, quando não se lhe impõe pura e simplesmente.
É o caso do relato de Talita Figueiredo, no Estado de hoje, sobre as fantasias que “não param nas prateleiras” do comércio de carnaval, no Rio de Janeiro.
E quais são essas tão desejadas fantasias? As de policiais do Bope. E quem as procura? Crianças como Paula, 8 anos, neta do dono de uma loja do gênero. No ano passado, ela se vestiu de princesa. Neste, vai sair de short, colete com o símbolo da caveira, coldre e boina.
A fantasia é um hit, informa a reportagem. Fantasia, como em roupa de carnaval. Fantasia, como desejo de ser o que se veste. E hit, como em sucesso. Hit, como o tiro que acerta o alvo, num dos sentidos originais da palavra.
“Achamos que ia dar certo, mas não que ia vender tanto”. Comenta um comerciante. “Desde o início do mês, já quadrupliquei os pedidos.”
“Todas as variações que aqui chegam são vendidas rapidamente”, confirma outro.
Em algumas lojas, os vendedores já usam o colete. “Aqui, eu sou o capitão Nascimento”, se vangloria um deles.
Observação de mídia numa hora dessa? Só se for para agradecer à repórter do Estadão a amarga oportunidade de me fazer lembrar, pela enésima vez, da pergunta que fechava um artigo (já comentado aqui) do jornalista Alcino Leite Neto, da Folha, em março passado:
“É isto um país? É isto um povo?”