Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crédito a autor é direito de leitor

Não foi a primeira nem será a última vez, na imprensa brasileira, que um jornal ou revista, furado pela concorrência, mas obrigado a tratar da história objeto do furo, por sua indiscutível importância, dá o assunto com destaque mínimo, apenas para que não se diga que desserviu o leitor.


Ainda assim, o Estado de hoje foi além da conta ao noticiar, não no caderno nacional, como seria obviamente o caso – mas no caderno Metrópole, de assuntos locais – e ainda por cima na última página e em uma coluna – o vexame protagonizado pelo comandante do Exército, general Francisco Albuquerque, na Quarta-Feira de Cinzas.


No domingo, a coluna Elio Gaspari, publicada na Folha e no Globo, informou que o general, acompanhado da mulher, embarcou em um vôo da TAM, de Viracopos para Brasília, graças a uma carteirada.


O avião, que já estava sendo conduzido para a área de decolagem, recebeu ordem da torre do aeroporto para voltar ao portão de embarque, a fim de que nele se pudesse acomodar o casal Albuquerque. Tem mais: como o vôo estava lotado, outro casal foi induzido a ceder o seu lugar ao ilustre passageiro e senhora.


A notícia do dia é que a Comissão de Ética Política da Presidência da República decidiu investigar o episódio de provável abuso de poder, ouvindo o militar.


A Folha e o Globo chamaram a matéria na primeira página e lhe deram amplo destaque na seção nacional. No Globo, acompanhada do editorial “Carteiradas aéreas”.


Nele se lê: “Enganou-se quem achava que a redemocratização tinha acabado de vez com o tipo de postura “sabe-com-quem-está-falando?”. E mais:


“Dessa história saem mal o general, o Exército e o DAC, conivente com a carteirada. Foi atingido também o próprio estado de direito, pelo qual todos os cidadãos são iguais perante a lei. Sem exceção para os códigos aeronáuticos.”


Além de tratar o caso como se deve, a Folha não deixou de citar o nome de quem o havia revelado. [O Globo fez isso ontem.]

O Estado, além de esconder o desdobramento do episódio de prepotência – a retranca que antecede a sua matéria é “Embarque” (!) –, não deu o nome do jornalista que o divulgou em primeiro lugar. Não o fez tampouco ao abordar o fato ontem, quando até publicou foto de bom tamanho do general.


Na imprensa americana, seria um escândalo se um dos três principais jornais do país fizesse o mesmo porque os outros dois o deixaram a ver aviões diante de um fato de interesse público.


O Estado tem uma pinimba com o jornalista autor do furo. A sua coluna saía no jornal [e no Globo] até que um comentário nela publicado desagradou a casa. Sem citá-lo, mas chamando-o estranhamente de “jornalista” – assim, entre aspas, como se ele não o fosse –, o Jornal da Tarde, dos mesmos donos, o desancou em editorial. Por isso ele trocou o Estado pela Folha.


Mas isso não é razão para negar crédito a quem crédito merece. Isso também é direito do leitor.


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