A Prefeitura lançou o programa São Paulo Protege Suas Crianças – “Dê mais que esmola. Dê futuro”. Propõe que as pessoas deixem de dar esmolas nos sinais de trânsito e em outros locais e passem a contribuir para um Fundo Municipal da Criança e do Adolescente, com abatimento de imposto de renda (1% pessoa jurídica e 6% pessoa física).
No site da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, explica-se: “O programa São Paulo Protege suas Crianças combina o controle de freqüência à escola com ações de complementação da jornada escolar (o Pós-Escola); a inclusão em programas e serviços de proteção social; o fortalecimento da família; a geração de renda familiar, por meio do pagamento de subsídio financeiro mensal, como o Renda Mínima, e ações de natureza educativa e social. Abordagens sistemáticas das crianças ´´em situação de rua´´, cadastro e acompanhamento dessas famílias e a avaliação e monitoramento de todas essas ações também são ações neste programa”.
A Folha de S. Paulo publicou na sexta-feira (4/11) um editorial que, mais uma vez, parece falta de assunto, como quando o jornal viu atentado à liberdade de expressão na proibição de out-doors oferecendo prostituição em casas noturnas para equipes da Fórmula 1. Chama-se “Estatização da esmola” e 1) reconhece que o projeto tem alguma lógica; 2) diz que “parece correto” afirmar que a esmola contribui para manter uma situação de indigência; 3) julga que, “no papel, são boas idéias”. Mas, e então temos o famoso “mas”, célebre em documentos políticos que procuram contentar diferentes correntes políticas, vem a objeção. No caso, um porém:
“É preciso lembrar, porém, que o Brasil tem um histórico de fundos públicos criados com os mais inatacáveis objetivos, mas que, em pouco tempo, foram desviados para financiar outras necessidades governamentais”. E cita a notória CPMF.
O editorial termina desculpando-se pelo que parece ser “excesso de ceticismo”.
Se tivesse despido a toga de juiz e vestido uma roupa de trabalho, o jornal teria feito a sugestão mais adequada a um órgão de comunicação: que todos os passos do programa sejam relatados na internet, por exemplo, para que não haja dúvida sobre a correta aplicação dos recursos. Em artigo na edição de ontem, o presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente, Rubens Naves, defende a iniciativa da prefeitura. E na edição de hoje a vereadora Soninha, que é do PT, critica o editorial da Folha. Nos seguintes termos:
‘Chamar a iniciativa da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social de ´´estatização da esmola´´ (Opinião, 4/11) não é ceticismo apenas, é má vontade que beira o deboche. O termo ´´esmola´´ é inegavelmente pejorativo. O título sugere que a prefeitura irá apropriar-se da esmola que seria dada diretamente às crianças carentes. Ou seja, além de desconfiar dos resultados, baseada em ´´experiências anteriores´´, a Folha bota lenha na fogueira da eterna desconfiança que cerca qualquer coisa que venha do poder público. As pessoas já preferem dar dinheiro no farol do que ´´ao governo´´ ou ´´aos políticos´´… O editorial incentiva esse pensamento, ainda que não pretenda isso, e pode ajudar a melar um projeto que é baseado em diagnóstico super cuidadoso, envolve uma série de ações simultâneas (com as crianças e suas famílias) e, em princípio, é muito bom. E olha que é uma vereadora da oposição que está dizendo isso. Eu também fui ´´cética´´ no começo, achando que vinha aí mais um slogan para enfeitar uma estratégia sem profundidade, mas, como deveria fazer, busquei informações (será que a mídia também o faz para valer?) e descobri que a SMADS sabe o que está fazendo. Minha função é fiscalizar para ver se funciona bem, e não ´´secar´´ só porque vem de um governo que, para ´´completar´´, não é do meu partido.’ Soninha Francine, vereadora pelo PT (São Paulo, SP).
A questão das crianças na rua em São Paulo e no Rio de Janeiro é da maior importância. Antiga, e maltratada pela mídia. Há agora uma boa oportunidade para estudar melhor o problema e as soluções. Mas há pessoas e grupos que, nessa matéria, adoram o problema e detestam a solução, como costuma dizer o ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira Luiz Hafers.