Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crime na USP

O empenho dos jornais paulistanos em dar uma cobertura adequada do assassinato de Rafael Fortes Alves por Fabio Nanni, na USP, ocorrido ontem, mostra por contraste como crimes que atingem pessoas de outros segmentos da sociedade são tratados precariamente. Todos os dias ocorrem assassinatos pavorosos aos quais são dedicadas no máximo poucas linhas. É verdade que os jornais não teriam estrutura para acompanhar tudo com o mesmo detalhamento. Esse problema “físico” não impede, porém, que se constate a prevalência da lei da proximidade social. Um crime na USP, envolvendo alunos de jornalismo, mexe diretamente com os leitores. A Folha, que neste sábado dá a melhor cobertura, designou nove repórteres para a tarefa.


Em relação à técnica jornalística, cabe anotar que cada jornal dá um retrospecto diferente de outros crimes com morte ocorridos na USP. Por ordem alfabética, o Diário de S. Paulo menciona cinco mortes. O Estado de S. Paulo menciona quatro mortes. Segundo o Diário, em 1995 um estudante de engenharia matou duas pessoas antes de se suicidar, e, segundo o Estado e a Folha de S. Paulo, uma das vítimas dos tiros sobreviveu. O Diário é o único jornal que menciona o caso de um estudante de 20 anos cujo corpo foi achado no Tietê. A Folha relaciona quatro mortos, mas entre eles está um garoto de 15 anos achado morto na raia olímpica em 1997, que não aparece nos demais, e não está uma moça que caiu de uma janela da Faculdade de Direito, no Centro, em 1993. O Jornal da Tarde recapitula duas mortes. O Globo fala em “outros crimes” mas só especifica um. Em conjunto, esses cinco jornais mencionam sete mortos na década de 1990.


O Globo diz que existe uma fita cassete de uma conversa entre Rafael e Fabio. Segundo a Folha, “alguns estudantes chegaram a gravar uma entrevista com o assassino logo após o crime”.


Os jornais noticiam que o procurador-geral da USP, João Alberto Del Nero, descartou mudanças no policiamento da universidade. Nenhum jornal mencionou a presença de traficantes de drogas, talvez o maior problema de segurança no campus da USP.


Arma branca


Integrantes reacionários da frente que defende a venda legal de armas não tiveram escrúpulos em usar como argumento o assassinato na USP com arma branca. Atenção, leitor: não escrevi que a frente pelo não no referendo é reacionária, tout court. Escrevi que ela agrega indivíduos e grupos reacionários. Novamente atenção: não escrevi conservadores, mas reacionários. Cumpre assinalar que também defensores da proibição da venda legal de armas usaram a mesma tragédia para se manifestar, destacando que se o rapaz estivesse como uma arma de fogo mais gente poderia ter sido atingida.