Cento e trinta profissionais perderam seus empregos na Rede Brasil Sul (RBS), parceira da Rede Globo no sul do Brasil. E nos Estados Unidos, a Associação Americana de Editores de Jornais (ASNE) revelou que 1.300 jornalistas norte-americanos foram demitidos por empresas jornalísticas durante o ano de 2013.
Os dois fatos mostram a manutenção da tendência das empresas de comunicação em cobrir perdas operacionais com o enxugamento de redações, uma política que já foi comparada inúmeras vezes ao ato de dar um tiro no próprio pé. Já se tornou um lugar comum afirmar que a minimização das redações e a substituição de profissionais experientes por recém-formados implica uma queda de qualidade na produção jornalística, o que inevitavelmente se reflete na perda de leitores e redução da receita dos jornais e revistas.
No caso americano, o desemprego entre jornalistas no ano passado foi menor do que em 2012, quando chegou a 2.600 demitidos em 12 meses. Mas se tomarmos em conta os números desde 1989, a redução do número de empregos em redações jornalísticas nos Estados Unidos chega a espantosos 35%, um índice que a própria ASNE considera preocupante.
A insistência no recurso à redução da força de trabalho nas redações mostra a dificuldade dos executivos de empresas jornalísticas em aceitar o ajuste de expectativas financeiras nesta transição da era analógica para a digital no setor da informação e comunicação. Acostumados a lucros líquidos da ordem de até 30%, os donos de conglomerados jornalísticos qualificaram inicialmente como transitória a queda abrupta de lucratividade na virada do século; com isso, perderam tempo precioso para ajustar-se à nova realidade e agora ficaram sem reservas para enfrentar a mudança que é permanente e irreversível.
Ninguém tem ainda uma fórmula para resolver a crise do modelo de negócios das empresas, mas os jornalistas demitidos já começam a vislumbrar alternativas e elas se concentram em duas áreas: os nichos informativos especializados e o jornalismo comunitário. Nenhuma delas oferece salários milionários, mas pelos dados mais recentes, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, os profissionais estão mais preocupados em explorar novas oportunidades do que com o contracheque.
Os nichos informativos são atraentes na medida em que o profissional pode explorar de forma individual – ou com um reduzidíssimo número de parceiros – a experiência, dados, informações e contatos acumulados durante o trabalho em redações. Muitos estão vendendo matérias jornalísticas para as mesmas empresas que os demitiram. O problema é que a consolidação financeira de um nicho informativo demora tempo, o que vai exigir paciência e uma poupança prévia para sobreviver. Mas depois de consolidado, o nicho informativo é financeiramente estável, como demonstram os casos de profissionais que renunciaram a empregos sólidos para criar o seu próprio negócio.
Mas a maioria dos desempregados está procurando uma forma social de sobreviver à perda do emprego com garantias trabalhistas. Trata-se do jornalismo comunitário, uma tendência em franca ascensão na imprensa norte-americana, alimentada pela emergente preocupação das pessoas em resolver problemas locais diante da ineficiência e gigantismo da máquina administrativa estatal. O ressurgimento da pequena imprensa local, que está sendo estudado aqui no Brasil pelo projeto “Grande Pequena Imprensa”, do Instituto Projor/Observatório da Imprensa, gerou um aumento da vendagem das publicações locais da ordem de 2,78% em 2013, apesar da crise na indústria da comunicação jornalística.
Em agosto deste ano, a Columbia Journalism Review identificou um forte crescimento no número de iniciativas de jornalistas na captura, processamento e análise de dados municipais, um filão do jornalismo em base de dados que estava inexplorado. Esta emergente tendência revive a ênfase no patrulhamento das gestões municipais diante da preocupação dos cidadãos com a aplicação dos recursos pagos em impostos.
Ainda segundo a CJR, jornais locais como o The Plain Dealer, da cidade de Cleveland, no estado de Ohio (EUA), já produzem quase metade de sua pauta diária de notícias a partir da análise de dados da prefeitura. A produção de notícias a partir de estatísticas está sendo realizada essencialmente por profissionais recém-formados e por jornalistas experientes, uma combinação de talentos que tem se revelado fundamental para o aumento dos acessos ao site do jornal e na vendagem em bancas.
Na Holanda, o jornal Dichtbij transformou-se num fenômeno do jornalismo local ao acumular lucros nos últimos dois anos, apesar do ceticismo dos executivos centrais do conglomerado Telegraaf Media Group (TMG), que controla a publicação. Criado em 2010, o Dichtbij, um dos 44 jornais locais do grupo, foi deficitário até 2012, quando passou a colher os frutos de uma controvertida estratégia publicitária. O jornal oferecia dois anos de publicação grátis para anunciantes se eles firmassem um contrato de cinco anos, os três últimos com pagamentos mensais.
Hoje o Dichtbij tem 30 funcionários, metade deles jornalistas, e deixou de ser um peso dentro das finanças do TMG, cujos executivos já começaram a copiar o mesmo esquema para outros jornais locais do grupo.
Aqui no Brasil o jornalismo comunitário ainda é pouco valorizado, apesar da experiências significativas como O TREM Itabirano, em Itabira, Minas Gerais ou o Voz de Rio das Pedras, no Rio de Janeiro. Há várias outras iniciativas que ainda não ganharam relevância nacional por falta de circulação de informações sobre o segmento. A troca de experiências neste segmento é vital para a sobrevivência das publicações porque todas podem aprender com os erros e sucessos mútuos.
Para os jornalistas desempregados no Brasil, a alternativa da imprensa comunitária pode ser bem mais do que a busca de uma nova fonte de renda. Pode ser a reinserção da profissão na utilização da notícia na produção de conhecimento socialmente relevante e com ele gerar mais capital social capaz de alavancar o desenvolvimento socioeconômico de comunidades sociais.