Até o momento em que escrevo este texto, o Verbo Solto já tinha recebido 329 comentários sobre o artigo de ontem [“Vitória do NÃO gera surto de plebiscitismo”, ver abaixo].
A rigor, foi um pouco mais do que isso: cinco mensagens tiveram de ser eliminadas por transgredir as regras do blog e do Observatório da Imprensa, que o hospeda, vedando a publicação de expressões ofensivas e de baixo calão.
A massa de comentários é uma amostra – provavelmente representativa, embora não tenha como saber com certeza – das motivações dos eleitores no referendo de domingo; das suas idéias e, principalmente, sentimentos, sobre a convocação mais frequente de consultas populares; dos temas de que poderiam tratar; e da irritação difusa com os políticos em geral e o atual governo em particular.
É um rico painel, como se diz, do estado de espírito de uma parcela presumivelmente ponderável da população – ou, ao menos da população que se beneficia da inclusão digital, como também se diz.
A maioria dos comentários revela um otimismo muito maior do que o meu sobre a democracia direta, a que me referi como “uma arma carregada de problemas”.
Voltarei ao assunto. Hoje acho importante ressaltar a prontidão das pessoas para se exprimir, quando suficientemente motivadas e quando dispõem de canais para tal.
Essa disposição me parece mais valiosa até do que o conteúdo em si das manifestações, algumas elogiáveis, outras criticáveis, não pelas posições que traduzem, mas pelo maior ou menor grau de informação em que se fundamentam e pela maior ou menor coerência e lógica interna dos argumentos apresentados.
Pois sem participação não emerge a diversidade, e sem diversidade exposta livremente, dentro das normas elementares de civilidade, não há democracia.
Bem dizem os americanos: se não houvesse diferenças de opinião, não haveria corrida de cavalos.
O que me leva a registrar que dois dos três maiores jornais brasileiros, o Globo e a Folha – por coincidência, ou não, favoráveis ao SIM – se comportaram como manda a ética do ofício, procurando ceder espaço igual às posições em confronto, seja nos artigos assinados, seja na seção de cartas dos leitores.
O Estado, do time do NÃO, quero crer que só publicou um ou dois artigos, na sua página Espaço aberto, contrários à linha da casa, desde que a campanha do referendo entrou na reta final.
No sábado, por exemplo, a Folha dividiu democraticamente a seção Tendências/Debates entre defensores e opositores do comércio de armas. No domingo, na página equivalente, o Estado deu um artigo ao tema – pelo NÃO, como era de prever.
Hoje mesmo a Folha dá outro exemplo da sempre bem-vinda pluralidade na mídia.
No caderno Dinheiro, o colunista Luís Nassif critica duramente a consulta da antevéspera (“o tema era complexo, o referendo foi inoportuno, a questão, mal formulada”), que, diz ele, não desfez o seu ceticismo em relação à democracia direta.
Na página 2, o colunista Clovis Rossi termina o seu comentário com uma exortação: “Que venham, pois, mais plebiscitos e/ou referendos.”
Ao lado, no primeiro dos três editoriais do dia, sob o título “A arma do referendo” [você leu isso primeiro aqui…], o jornal defende as consultas, chamando embora a atenção, destacadamente, para os perigos nelas embutidos. Cita, para ilustrar, o caso da Califórnia [você leu isso…]. Daí, conclui, deveriam se restringir “a temas que impliquem mudanças de vulto e observadas as cautelas constitucionais e do bom senso”.
Os leitores precisam estimular a diversidade de idéias nos órgãos de mídia. Mandando elogios aos jornais que a valorizam e cobrando dos outros que façam o mesmo.
***
Serão desconsideradas as mensagens ofensivas, anônimas e aquelas cujos autores não possam ser contatados por terem fornecido e-mails falsos.