A internet está provocando nestas eleições municipais dois tipos de debate: um vinculado a questões jurídicas, constitucionais e técnicas, e outro ligado às conseqüências da exclusão digital.
As marchas e contramarchas dos tribunais na regulamentação do uso da internet aumentaram as incertezas e confirmaram aquilo que já era conhecido, ou seja, é uma missão quase impossível regular uma tecnologia radicalmente nova em matéria de comunicação usando ferramentas legais desenvolvidas noutra realidade.
A Justiça Eleitoral está diante de um dilema difícil porque a questão da internet é importante na definição da disputa pelo poder em âmbito nacional e regional. Só que nas circunstâncias atuais o debate acontece num clima político onde predominam os interesses paroquiais nas disputas pelos cargos de vereador e prefeito, nos 5.562 municípios brasileiros.
Este paradoxo coloca em evidência os diferentes contextos da internet no país, em especial quando a questão política é levada em conta. A exclusão digital joga neste ambiente um papel preponderante, mas não é só isto.
As classes A e B têm mais acesso à internet e a utilizam, prioritariamente, como instrumento para obter e disseminar informações de interesse pessoal. Neste segmento social é necessário distinguir os adultos, que usam pouco a rede como ferramenta para a interatividade, dos jovens, cujo maior interesse na rede é justamente o lado social.
Em matéria de política, as diferenças não são menos intensas. O grande diferencial da rede como ferramenta de promoção de ações coletivas funciona mal entre os adultos das classes A e B porque eles são individualistas, e é o grande atrativo no ambiente mais jovem, onde a política é malvista.
Numa eleição municipal, o principal papel da internet seria o de funcionar como articulador de interesses comunitários graças à interatividade, seu principal diferencial em relação aos demais canais de comunicação. A questão comunitária é especialmente relevante nas classes C e D porque a ação coletiva é a grande ferramenta que este segmento social dispõe para compensar sua debilidade econômica, em matéria de ação política.
Mas como a exclusão digital atinge de forma mais intensa justamente as classes C e D, isso acaba fazendo com que elas não possam usar a principal vantagem que a internet poderia lhes oferecer: a formação de comunidades usando ferramentas digitais. Esta é uma das principais razões da baixa utilização da rede nas campanhas de vereadores e prefeitos, na maioria das cidades brasileiras.
Nas capitais ainda é possível ver alguns candidatos usando o horário eleitoral gratuito para promover suas páginas web onde detalham seus programas políticos. Mas são raríssimos os que dialogam com eleitores usando a interatividade dos chats, fóruns e comentários.
Como os jovens das classes A e B fogem da política, e como a exclusão digital inviabiliza seu uso pelas classes C e D, a internet brasileira ainda é um território quase privativo do jogo do poder na esfera nacional e estadual.