Matéria na Folha de domingo, assinada pelo repórter Kennedy Alencar, afirma que o “fator determinante” da decisão do presidente Lula de criar a TV Pública foi o tratamento “desequilibrado” da Rede Globo ao chamado dossiegate.
Às vésperas do primeiro turno da eleição de 2006, o Jornal Nacional exibiu imagens do R$ 1,7 milhão que seria usado pelos “aloprados” do PT para comprar o dossiê Vedoin.
O material envolveria o candidato afinal vitorioso para o governo de São Paulo, o tucano José Serra, no esquema de compras superfaturadas de ambulâncias em municípios de diversos Estados.
Lula teria dito à época que um governo não poderia ficar “na mão da Globo”.
Na reportagem, a decisão e as aspas atribuídas a Lula não têm pai, nem mãe. Apenas a expressão clássica “Segundo a Folha apurou”.
Num jornal como o New York Times, sairia algo do gênero “segundo o Times apurou junto a [número e qualificação das fontes] que não autorizaram a divulgação dos seus nomes porque [as razões do pedido de anonimato]…”
Não refresca o suficiente, mas, se esse é o máximo a que se pode chegar, torna a notícia um pouco mais crível do que a fórmula seca da Folha, que exige a confiança cega do leitor – no jornal e, especialmente, no jornalista que a apurou.
Naturalmente, ele foi ouvir o proverbial outro lado. Deu nisso:
”Procurada pela Folha, a Central Globo de Comunicação respondeu ontem [que] ‘as boas normas de jornalismo recomendam tanto a não-publicação de críticas em off [nas quais as fontes não se identificam] quanto o comentário sobre críticas em off’.”
A “Central Globo de Comunicação” – por que a omissão do nome do responsável pela resposta? – tem razão, mas não toda a razão.
As boas normas de jornalismo não impedem quem quer que seja, menos ainda uma provável parte interessada, de comentar uma notícia – no caso o alegado “fator determinante” da decisão de Lula. Basta começar o comentário com a ressalva “Supondo verdadeira a informação…”
O off de um e o silêncio de outro ficaram aquém do que o leitor tem direito.
P.S. Aos interessados em revisitar o problema jornalístico envolvido no episódio de que trata a matéria da Folha, leiam neste blog “Cadê os bastidores das fotos do dinheiro?”, de 3/10/06 e “O vídeo, divulgado. O áudio, ocultado”, de 15/10/06.