Já que chamou na primeira página, na edição de 5 de abril, a reportagem sobre o ‘plano’ da organização Var-Palmares, em que militava Dilma Rousseff, para sequestrar o ministro Antônio Delfim Netto em 1969, a Folha tinha a obrigação de fazer o mesmo com a confissão de que errou duas vezes naquela história. Ao não fazê-lo, errou de novo.
A matéria em que o jornal se retrata ocupa meia página da edição deste sábado, 25.
A Folha reconhece que errou ao publicar como autêntica e originária dos arquivos do Dops uma ficha policial – recebida por e-mail – da atual ministra da Casa Civil.
A Folha estampou o documento sem conferir a sua procedência. Só foi checá-la depois que ministra tomou a iniciativa de procurar o jornal, dizendo desconfiar de que se tratava de uma falsificação. Na ficha, ela é acusada de participar de ações armadas.
Em carta ao ombudsman da Folha, ela desmente enfaticamente o seu envolvimento com ‘ações pelas quais nunca respondi, nem nos constantes interrogatórios, nem nas sessões de tortura a que fui submetida quando fui presa pela ditadura’. Ela destaca ainda nunca ter sido ‘denunciada ou processada pelos atos mencionados na ficha falsa.’
Na retratação, a Folha não conta quem lhe passou a ficha. Fala apenas em ‘uma fonte’. A Folha tampouco diz que a ficha é uma montagem, embora admita não ter encontrado nenhuma referência a ela em nenhum dos arquivos em que pesquisou para a matéria. A posição do jornal é de que, ‘pelas informações hoje disponíveis’, a autenticidade do papel ‘não pode ser assegurada – bem como não pode ser descartada’.
O maior erro da Folha, no entanto, foi outro: publicar o texto sensacionalista ‘Grupo de Dilma planejou sequestro de Delfim Netto’. A referência ao ‘grupo de Dilma’ corresponde ao que os americanos chamam ‘culpar por associação’. No limite, equivale a dizer ao leitor: ‘Veja só quem quer ser presidente da República.’ Dilma negou desde a primeira hora ter conhecimento do presumível plano – e a sua militância é conhecida.
E, pelo próprio teor da reportagem, fica claro que o verbo ‘planejar’ é no mínimo impróprio. A Var-Palmares, isso sim, cogitou o sequestro, segundo entrevista – por telefone! – com um ex-dirigente da organização, Antonio Roberto Espinosa. A ideia não foi em frente.
Mas não teria graça nenhuma um título como ‘Grupo armado pensou em sequestrar Delfim em 1969’. Seria esfriar um prato apimentado com uma pitada de verdade.
Para o bem do jornalismo, resta esperar que seja verdadeira pelo menos a notícia exclusiva da mesma Folha de hoje, segundo a qual Dilma ‘passa por um tratamento prolongado de saúde’ no hospital Sírio-Libanês de São Paulo. Quão prolongado, não está claro. O jornal diz que ‘há um mês’ ela vem fazendo exames e que colocou preventivamente um ‘cateter de longa permanência que facilita o tratamento quimioterápico ou com antibióticos’. A ministra, segundo a Folha, não comentou a informação.
P.S. [Acrescentado às 16:40 de 25/4]
Evidentemente, este texto foi redigido antes de a ministra revelar que está em tratamento médico, depois de extrair um linfoma.