Com raras exceções, como as colunas de Celso Ming (O Estado de S.Paulo) e Miriam Leitão (O Globo) de hoje, a imprensa brasileira ainda deve muitas reportagens para mostrar ao leitor brasileiro o real alcance e as razões da elevação dos preços do petróleo. O noticiário diário sobre o sobe-e-desce dos barris no mercado internacional não explica porque se amplia a cada semana o leque de fatores que influenciam as cotações. Ora é o Iraque, ora é a ameaça do terrorismo na Arábia Saudita, ora são os baixos estoques internos dos EUA, ora são os furacões do Golfo do México. Os motivos para a alta crescente dos preços – o barril praticamente triplicou de preço nos últimos quatro anos – vão se substituindo, sem que se exponha alguns fatos e verdades essenciais, como, por exemplo:
1. O real problema do abastecimento de petróleo no mundo não é a falta do produto, mas sim a concentração geográfica da produção e exploração: a Arábia Saudita, maior produtora do mundo, e seus vizinhos são responsáveis pelo fornecimento de 75% de todo o petróleo queimado no mundo;
2. Petróleo não serve apenas para movimentar automóveis. O óleo também é essencial na industrialização de uma extensíssima gama de produtos, que se estende das indústrias de plásticos e móveis às de remédios e alimentos;
3. Os EUA – que respondem por 25% do consumo mundial – e a China são os dois maiores queimadores de petróleo do mundo. Ambos os países, principalmente a China, continuam apresentando taxas vigorosas de crescimento. Esta é uma das razões essenciais para a alta contínua do petróleo nos últimos anos.
A pergunta que fica é a seguinte: o atual parque de refinarias instalados no mundo é capaz de processar o suficiente para saciar o apetite dos dois maiores consumidores?
4. Duas das economias emergentes que mais crescem atualmente no mundo – a China e a Índia subsidiam o preço do petróleo em seus mercados internos. Um dos resultados dessa política é o desperdício. Segundo a revista The Economist, ‘para gerar um dólar a mais no PIB, os países de economia emergente, gastam o dobro do petróleo dos países de economia desenvolvida’.
A série de informações essenciais para se compreender a instabilidade de um dos principais atores da economia é extensa, e mereceria uma série de reportagens especiais. Quem sabe algum jornal ou revista se aventure na empreitada, de forma a evitar que o leitor brasileiro seja surpreendido, a qualquer momento, por outra crise global de energia.
O empenho também serviria para se quebrar pelo menos um preconceito contra a política externa do Brasil. Muito já se leu e falou sobre a inutilidade da visita de Lula ao ditador líbio Kaddaf, e dezembro de 2003. A imprensa brasileira, com a revista Veja à frente, noticiou o encontro como inútil e dispensável, entre outros adjetivos. Mas, uma semana depois, quando o primeiro-ministro britânico Tony Blair, percorreu o mesmo caminho trilhado pelo presidente brasileiro, não se pronunciou um pio acerca da incoveniência da visita.
A resposta para ambas as visitas veio duas semanas depois com a reportagem de capa da revista Fortune: ‘Líbia, o novo caminho do ouro negro’.
A imprensa tupiniquim, para evitar contradição, não seguiu o hábito de repercutir a reportagem.