Uma vez estabelecido que a purgação do atual período político conduzirá a (espera-se) profundas mudanças, é recomendável lembrar de alguns princípios de funcionamento do estado e das instituições – inclusive a imprensa – escritos por Rui Barbosa. Descontado o pernosticismo típico do português do final do século 19 e começo do século 20 dos longos discursos do “Águia”, algumas de suas definições podem ser úteis e servir como parâmetro de procedimentos e normas para o trabalho dos jornalistas.
Os lembretes deixados por Rui Barbosa merecem ser levados em conta principalmente porque a imprensa – apenas considerando-se o atual estágio da crise política – foi escritora e personagem do processo que desarmou o projeto de poder do PT e – pelo menos até o momento – atingiu em menor grau o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Como escritora, a imprensa pautou a crise com bons momentos de reportagem; como personagem, permitiu-se voluntária e involuntariamente ser pautada por diversos personagens – de Roberto Jefferson a obscuros arapongas travestidos de “jornalistas investigativos”. A troca de intimidades com personagens que transitaram na criminalidade justifica a lembrança dos seguintes princípios elementares escritos por Rui Barbosa:
Sobre as instituições
1892 – As instituições planejam-se para a humanidade com as suas contingências e as suas fraquezas, contando especialmente com elas, e tendo particularmente em mira as violências, as mancomunações, as corruptelas, que possam ameaçá-las ou explorá-las.
Três Poderes
1892 – O Congresso aprecia o fato político à luz da conveniência ou do direito fundamental. A Justiça entende nas questões civis, restabelecendo o direito do indivíduo, quando o Executivo, para o ferir, transpôs a barreira constitucional.
Sobre o jornalista como homem público
[…] O homem público é o homem da confiança dos seus concidadãos, o de quem eles esperam a ciência e o conselho, a honestidade e a lisura, o desinteresse e a lealdade; é o vigia da lei, o amigo da justiça, o sacerdote do civismo. (do ‘A Imprensa e o Dever da Verdade’.)
A imprensa é a vista da Nação.
O que é a pátria
1903 – A pátria não é ninguém: são todos; e cada qual tem no seio dela o mesmo direito à idéia, à palavra, à associação. A pátria não é um sistema, nem uma seita, nem um monopólio, nem uma forma de governo: é o céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da liberdade. Mas o patriotismo, praticamente, consiste, sobretudo, no trabalho.
Sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias
1891 – Nenhuma instituição é mais relevante, para o momento regular do mecanismo administrativo e político de um povo, do que a lei orçamentária. Mas em nenhuma também há maior facilidade aos mais graves e perigosos abusos.
Sobre a morosidade da Justiça
1920– Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito das partes, e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade. Os juízes tardinheiros são culpados, que a lassidão comum vai tolerando. Mas sua culpa tresdobra com a terrível agravante de que o lesado não tem meio de reagir contra o delinqüente poderoso, em cujas mãos faz a sorte do litígio pendente.
Sobre a resistência do Judiciário a mudanças
1919 – As constituições são conseqüências da irresistível evolução econômica do mundo […]. A inflexibilidade individualista dessas cartas, imortais, mas não imutáveis, alguma coisa tem de ceder ao sopro da socialização, que agita o mundo.