Se existe um problema que desafia a nossa capacidade de pensar sobre o dia-a-dia, este problema é a forma como lidamos com a informação. Estamos acostumados a usar a informação como se ela fosse um bem privado pessoal e agora descobrimos que ela passa a ser cada vez mais uma questão coletiva.
Basta abrir os jornais ou assistir aos telejornais para testemunhas como os governantes, políticos, empresários, líderes comunitários, protagonistas de eventos policiais e esportistas usam informações em beneficio próprio.
Não faz muito tempo, um ministro de Estado aconselhou os brasileiros a não converter mais carros para o uso de GNV. A recomendação do ministro Nelson Hubner, a exemplo da maioria das declarações de políticos brasileiros, foi feita a partir da idéia de que a informação é um bem usável de acordo com os interesses de quem a detém.
O ministro, como quase todos os políticos que exercem algum poder no governo, tanto faz federal, estadual, municipal e até distrital, tem acesso privilegiado a informações e sua advertência sobre a conversão de veículos particulares para o uso de gás embutia um recado decifrável apenas por quem está diretamente envolvido no problema.
Para o dono de um carro movido a GNV, a frase do ministro soou como uma ameaça, porque induz à idéia de que vai faltar gás, justo no momento em que o mesmo governo do senhor Hubner anuncia a descoberta de um megalençol petrolífero no litoral sul do Brasil. Foi, portanto, uma declaração que ignorou o interesse coletivo.
O problema não está apenas nos corredores e gabinetes do poder. Está também na fila do ônibus, no trânsito ou na lista de espera no INSS. As pessoas comuns também usam, freqüentemente, a informação em proveito pessoal e não se preocupam com as conseqüências de uma orientação errada ou um dado não checado.
Todos nós, poderosos ou não, dependemos essencialmente da informação e o fato de esta passar a ter tanto significado no nosso quotidiano mostra que ela precisa ser vista a partir de uma ótica coletiva. O ministro não pode gerar alarmismo sobre o GNV porque esta informação vai provocar prejuízos econômicos muito mais importantes do que os objetivos privados do político Nelson Hubner.
Ser vítima de informações erradas tornou-se um fenômeno tão freqüente que a maioria de nós já desenvolveu um comportamento cínico que nos leva a ficar de pé atrás como quase tudo que é publicado ou anunciado. Um cinismo que além de não nos proteger de novas frustrações também bloqueia a característica mais inovadora do processo informativo, que é a criação de novos conhecimentos a partir das informações, dados e fatos recebidos por meio da comunicação.
A imprensa tem um papel muito especial na área da informação porque esta é a sua matéria-prima. Por isso, ela é ao mesmo tempo causa e vítima neste processo. Causa, porque subscreve a irresponsabilidade informativa ao reproduzir declarações de políticos, governantes, empresários, personalidades e cidadãos comuns sem a necessária contextualização. E vítima, porque o leitor acaba intuindo a existência de interesses ocultos e desconfia da informação — o que, na prática, significa desvalorizar o produto principal de um jornal ou telejornal.
Por isso a imprensa deveria prestar mais atenção nas bolsas de valores, onde a informação é tratada com mil e um cuidados, porque ali ela vale milhões de reais. Os investidores sentem no bolso as conseqüências de um boato ou notícia descontextualizada e criaram um sofisticado mecanismo de proteção dos negócios no pregão contra o mau uso da informação.