Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Jornais colidem na avaliação do desempenho de Palocci no Senado



As flores já haviam sido encomendadas, o discurso de despedida estava pronto desde a véspera, mas o defunto não apareceu. Ao contrário do que garantiram os jornais, primeiro timidamente durante o final de semana, depois taxativos na segunda e terça-feira desta semana, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, não caiu. A usina de rumores que vaporizou o principal pilar do governo de Luiz Inácio Lula da Silva funcionou a plena carga nos últimos dias, dando como certo que ele já era carta fora do baralho. Prováveis substitutos e todas as variáveis, limitações e conseqüências que cada um dos candidatos geraria foram alinhados, mas, pelo menos até segunda ordem ou nova denúncia mortal, Palocci continua no cargo.

A resposta à primeira pergunta é sim. Alguns jornais realmente entusiasmaram-se além da conta. Alguns, nas suas edições de hoje, continuam apostando que o ministro está com os dias contados.

Disse o Valor Econômico, por exemplo, na segunda-feira:



A frágil situação do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, não tem recuperação. Sua saída do governo, segundo apurou o Valor, é inevitável. ‘Agora, ele vai apenas cumprir os rituais de saída’, sustenta um assessor graduado do governo.
O futuro de Palocci teria sido selado a partir da opção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não desautorizar a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, em suas críticas públicas à política econômica e aos planos de ampliação de ajuste fiscal comandados pelo ministro. Na discussão, já em curso no núcleo do governo sobre a sucessão de Palocci, o que está em jogo é o futuro da política econômica.


Nos jornais de hoje, quatro dos seis mais influentes do país – Folha de S.Paulo, Jornal do Brasil, O Estado de S.Paulo e O Globo – tratam da audiência de Palocci na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. A interpretação sobre o êxito ou fracasso de Palocci não é unânime.

Diz a Folha de S.Paulo



A expectativa de que o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) dependia de seu desempenho diante da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado para permanecer no cargo dissipou-se antes mesmo de seu depoimento começar. Argumentando que aquele não seria o fórum adequado e sob o pretexto de que não iria esvaziar os trabalhos das CPIs, a oposição avisou que evitaria interrogar o ministro sobre as acusações de que tem sido alvo. A participação dos oposicionistas ficou assim restrita a questões sobre a política econômica.

À vontade, Palocci aproveitou o ambiente distensionado para se defender sem ser questionado e discorreu longamente sobre suas ações à frente da Fazenda. Disse que a polícia e o Ministério Público, encarregados de investigar supostas irregularidades em suas gestões como prefeito em Ribeirão Preto, vêm promovendo devassas e patrocinando atos de humilhação contra pessoas que ainda não tiveram o direito de se defender.


O Jornal do Brasil crava que a reação da oposição esvaziou a estratégia do ministro, mas enfatiza que a incerteza sobre seu futuro continua, e acrescenta:



O que era para ser a redenção de Antonio Palocci virou mais um momento de incerteza. Sua ida ao Senado para dialogar com a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) não foi suficiente para acabar com as dúvidas sobre sua permanência no governo. E nada leva a crer que ele convenceu políticos e mercado.

– A sociedade já o vê enfraquecido. Não adianta mais tapar o sol com a peneira – sintetizou o senador Jefferson Peres (PDT-AM).

Sob ataque pesado, o principal ministro de Luiz Inácio Lula da Silva deslocou-se até o Congresso na tentativa de estancar a crise e mostrar que ainda reúne forças para seguir no comando do Ministério da Fazenda. Ao chegar ao Senado, pelo menos por enquanto, desfez as versões de que teria jogado a toalha.


Já para o O Estado de S.Paulo, o ambiente foi bem mais carregado. Diz o jornal:



A intenção parecia das melhores: empenhado em reduzir a pressão a que está submetido, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, antecipou para ontem a sua ida à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, antes prevista para o dia 22.

Mas a estratégia deu errado. O objetivo era abrir um foro para Palocci se explicar e evitar a sua convocação para a CPI dos Bingos, que investiga denúncias de corrupção durante a gestão do ministro na prefeitura de Ribeirão Preto.

Mas a iniciativa não consultou a oposição, que, irritada, praticamente decretou a convocação do ministro pela CPI . Numa reação à manobra dos governistas, a oposição foi à reunião da CAE, mas se recusou a questionar Palocci sobre as denúncias feitas contra ele por seus ex-auxiliares na prefeitura, prolongando o clima de tensão em torno do ministro.



O Globo traz quadro bem mais ameno para o ministro, dando destaque à sua ‘iniciativa’:



Principal foco da crise política nos últimos dias, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, saiu ontem da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado confirmado no cargo. Pelo menos até novas denúncias ou provas de suposta corrupção em sua gestão em Ribeirão Preto ou na campanha presidencial de 2002. O ministro tomou a iniciativa de rebater as denúncias de corrupção relacionadas às suas gestões como prefeito, atribuindo-as a ‘investigações com interesses políticos claros’, e negou veementemente as supostas doações ao PT feitas por Cuba, Angola e pelas Farc. Ele também reagiu às críticas da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.



Diante das diferentes ênfases e interpretações, cabem as seguintes perguntas:



  • Os jornais teriam se apressado no obituário do ministro?
  • Se ele se dispôs a comparecer na CPI, seria verdadeira a informação, amplamente divulgada na semana passada, de que o ministro não aturaria comparecer a uma das CPI em curso?
  • A variação de interpretações sobre o desempenho reflete a expectativa de cada uma das empresas controladoras dos jornais?