Teria sido pedir muito aos grandes jornais que, na cobertura da convenção do PT que formalizou a candidatura do presidente Lula à reeleição, se abstivessem de chamá-lo de pai dos pobres e de compará-lo a Hugo Chávez?
Pelo lido, no caso de dois deles, Estado e Folha, teria sido, sim – embora se suponha que qualquer calouro de ciência política saiba que a expressão e a comparação são palavras e idéias fora de lugar quando aplicadas a Lula.
Ele pode ser criticado pelo que se queira, por se achar uma vítima dos ‘setores elitistas’, por exemplo, mas não pode ser objeto de um óbvio erro de pessoa.
Em um P.S., na nota de ontem ‘A mão que lava a outra’, registrei que o Estadão foi maldoso ao publicar que o slogan da campanha reeleitoral do presidente – ‘Lula de novo. Com a força do povo’ – reproduzia “o estilo populista do líder venezuelano Hugo Chávez”.
Depois, um assinante do Estado – que vive fora de São Paulo e portanto não recebe a edição final do diário – me informou que da edição que lhe chegou às mãos, fechada antes – não constava a referência a Chávez. Foi portanto acrescentada por algum redator ao texto original da repórter Vera Rosa, que cobre o PT há anos com objetividade e correção.
Fica portanto a dúvida se é de sua autoria ou de algum editor com vocação para editorialista a seguinte passagem de uma de suas matérias de hoje sobre a convenção. Nela se lê:
‘Inspirado em dois estilos populistas – o do líder venezuelano Hugo Chávez e do brasileiro Getúlio Vargas – o marketing do presidente reforça a imagem de ‘pai dos pobres’. Foi justamente esse tom o tom do discurso de ontem, quando o presidente assumiu sua candidatura à reeleição.’
Então ficamos assim: se ele promete ‘manter e aprofundar os programas sociais’ do seu primeiro mandato é porque se inspira em um presidente estrangeiro que nem havia nascido (por assim dizer), quando Lula defendia as mesmas coisas, e em um presidente brasileiro que morreu antes dele nascer (por assim dizer), e começar a carreira de ativista, combatendo a herança da política sindical do falecido, além de mais tarde se fazer político rejeitando o modelo nacional-populista autoritário do primeiro governo Vargas [o que Brizola, aliás, nunca lhe perdoou].
Para a Folha, Lula ‘se apresentou no figurino do ‘pai dos pobres’, ou, mais adiante no mesmo texto, ‘assumiu a face de ‘pai dos pobres’ quem vem desenhando há meses’. Isso, presumivelmente, porque disse que sua meta nunca foi apenas o superávit [fiscal], mas ‘o superávit social’.
Era tão mais simples – e correto – fazer como o Globo, na sua matéria ‘Todo o foco no social’, com o sub-título ‘Lançado à reeleição, Lula diz ter sido injustiçado e promete governar para os pobres’. Nada de Chávez, Vargas, ‘pai dos pobres’. Nada de jornalismo padrasto. Apenas – e tudo isso – informação objetiva.
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