O presidente Lula brinca de gato e rato com a mídia. Num dia, discursando, diz que a imprensa fez “insinuações grotescas” (sobre o reparcelamento das dívidas dos municípios com a Previdência). No outro, em conversa informal com um grupo de jornalistas, diz que a imprensa escreveu “a verdade”.
A julgar pelo que foi publicado, ninguém cobrou do presidente a espantosa contradição. Preferiram perguntar se a raiva dele já tinha passado. O que lhe deu a oportunidade de filosofar sobre a futilidade do sentimento (‘Quando a gente tem raiva só a gente sofre. Porque a pessoa de quem a gente tem raiva não fica nem sabendo que a gente tem raiva’).
O que importa, em todo caso, é que, diga o que Lula disser da imprensa, a imprensa publica. E ele deita e rola. Haja!
Outra que, bastou espirrar, vira notícia é a candidata de Lula a sua sucessão, Dilma Rousseff. O trabalho do Planalto é só produzir eventos para a ministra se mostrar e falar. Do resto, a mídia se encarrega, pode a oposição se queixar quanto queira de que o governo está fazendo campanha eleitoral antes da hora.
É uma bola de neve. Uma rede de TV entrevista a candidata e convida um jornalista de um diário, no caso o Valor, para participar da sabatina. No dia seguinte, o jornal dá à entrevista cerca de meia página – ficando a outra metade ocupada com mais duas matérias sobre a mesma personagem.
Dilma é do ramo. Perguntada sobre 2010, em vez de responder ‘Nada a declarar’ ou qualquer chatice do gênero, cita Zeca Pagodinho: ‘Deixa a vida me levar.’ Pule de 10, como se dizia antigamente: a frase garante a notícia.
A hegemonia do governo se estende aos termos da cobertura jornalística. Título em quatro colunas do Estado de S.Paulo da quinta-feira, 12: “Serra lança hoje ‘PAC paulista’ para aliviar impacto da crise”. Pouco se dá que, a certa altura da matéria, o próprio Serra apareça rejeitando, segundo o texto, a comparação com o PAC. “Estou apenas governando”, declara, com impacto zero.
Não se pode culpar a imprensa porque a oposição não dá notícia – salvo na épica cruzada do governador Aécio Neves para que o PSDB escolha o seu presidenciável pelo sistema de prévias eleitorais, o que ele e a torcida do Flamengo sabem que não haverá.
Agora tampouco se culpe o leitor por ficar bocejando em frente de matérias de tamanha densidade sobre os destinos políticos do país.