Saturday, 28 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Madame ainda vai dar o que falar

Dizem que os muito sabidos apreciam discutir idéias, os médio sabidos se interessam por fatos – e todos gostam de saber da vida alheia. Se ‘gente’ não vendesse feito pão quente, a mídia de massa morreria de fome.

Vai daí que a indústria da informação, em geral, e a que os americanos chamam de infotenimento, em especial, não podem passar sem o ‘lado humano’, qualquer que seja o prato do dia.

Na alentada e talvez indigesta refeição servida pela imprensa sobre a crise da corrupção no governo Lula, a primeira personagem a satisfazer aquela compulsão foi Fernanda Karina Somaggio, a ex-secretária de Marcos Valério

Os seus 15 minutos de fama chegaram ao auge quando a Folha a pôs na primeira página de uma edição dominical, vestindo sutiã de oncinha,e se esgotaram quando a Playboy não topou fotografá-la à moda da casa.

Mas, assim como a natureza de que falam os físicos, a mídia tem horror ao vácuo. E, já aflita para achar um(a) substituto(a)para dona Karina, eis que lhe cai no colo uma figura mucho mas, pero mucho mas caliente.

Trata-se, naturalmente, de Madame (no outro sentido do termo) Jeany Mary Corner.

Ela subiu ao palco quando um membro da CPI dos Correios perguntou à diretora financeira da SMPB de Marcos Valério e distribuidora da dinheirama para o caixa 2 dos políticos, Simone Vasconcelos, conhecia a ‘cafetina’ cujas garotas animavam, segundo ele, as festas mensalônicas promovidas em Brasília pelo bom Valério.

A partir daí começaram a pipocar nos diários notas dizendo, em outras palavras, que certos políticos dariam um boi para não aparecer nas listas valerianas – e uma boiada inteira para sumir da agenda da auto-denominada ‘empresária de eventos’.

Ontem, ela entrou de viva voz, falando ao mestre-blogueiro Ricardo Noblat. Disse que, por via das dúvidas, despachou para o Canadá todos os materiais capazes de comprometer a sua numerosa – e suprapartidária – clientela planaltina.

Hoje, enfim, ei-la no principal caderno do Estadão, com direito a foto (de costas)e matéria com título em quatro colunas ‘Jeany esconde agendas e diz que nada teme’ – o que parece um contrasenso, mas deixa pra lá.

Na entrevista ‘exclusiva’, como o entrevistador faz questão de assinalar, Jeany conta que mais de quatro vezes forneceu ‘recepcionistas’ para as festas de Valério, queixa-se de que foi ‘abandonada’ e relata o cômico episódio em que Ricardo Machado, sócio de Valério, lhe pede 23 moças.

Madame move mundos e fundos e consegue a equipe – para ser informada, na undécima hora, de que tinham cancelado o seu serviço, e para ser solicitada, numa meia-noite, a providenciar, afinal de contas, a encomenda.

No fim, ela entrega o advogado Rogério Buratti, assessor do então prefeito de Ribeirão Preto Antonio Palocci, que teria uma queda por uma certa Paula do seu, digamos, plantel. E disse mais, segundo a matéria: ‘Se a pesquisa do sigilo telefônico continuar, encontrará ligações de outros assessores do ministro.

Isso já não tem graça nenhuma e não é coisa que se publique. Primeiro, porque cheira a chantagem e surpreende que o jornal não se tenha dado conta disso. Segundo, porque ninguém – a começar da imprensa – tem qualquer coisa a ver com quem a burocracia brasiliense transa; só (e muito) com quem ela transaciona. Terceiro, porque não somos americanos nem puritanos.

Somos, como toda a gente, curiosos, isso sim. Daí que uma coisa é certa: muitos podem não ter lido a matéria ao lado dessa, que informa que ‘Tarso sofre nova derrota para grupo de Dirceu’. Mas ninguém deve ter passado batido pela ‘exclusiva’ com a ‘misteriosa’ Jeany.

Outra coisa é certa também: Madame ainda vai dar o que falar.

P.S. Nada a ver com o texto acima. Apenas uma comunicação: decidi tirar do ar (e arquivar) comentários que contenham agressões pessoais – a quem quer que seja – e termos de baixo calão. Os motivos hão de ser óbvios para todos quantos tenham lido recentes manifestações que ofendem menos o blogueiro do que os leitores em geral e os padrões éticos do site Observatório da Imprensa onde este Verbo Solto se hospeda. No mais, a crítica, mesmo a mais contundente, continua bem-vinda. [18/8, às 10h17.]