Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mão-de-obra de telemarketing

O Jornal Nacional exibiu ontem (24/11) uma reportagem sobre o mercado de trabalho criado por empresas de telemarketing. Por uma costumeira inclinação exortativa, a reportagem foi mostrada em meio a sorrisos confortadores de âncora e repórter. É um cacoete do jornalismo televisivo brasileiro. Não bastam as palavras. É preciso usar mímica também. Parêntese à parte, dizia-se que o setor oferece empregos de R$ 500 mensais que podem chegar até R$ 800 para quem sabe inglês. O presidente de uma entidade representativa do setor disse que o Brasil se credencia cada vez mais como opção no mercado internacional de call-centers.


Lindo. Só faltou dizer quanto ganha um operador de call-center nos países que pretendem exportar esses empregos. Os R$ 800 prometidos aqui correspondem, ao câmbio atual, a US$ 357. Alguém imagina que esse seja o salário de um operador nos Estados Unidos? Calma, calma. O custo de vida é diferente nos dois países. Sabemos disso. Mas a reportagem não poderia ter omitido que o atrativo maior da mão-de-obra brasileira é a baixa remuneração (não o único; há outros, como fuso horário, sotaque, tipo de cultura). Mesmo que o repórter precisasse acrescentar o dado sobre a diferença de contextos.


Como se sabe, a revista The Economist publica anualmente seu Big Mac Index. Trata-se, como diz a própria publicação, de tornar a teoria do câmbio “mais digerível”. Resumindo, compara-se o preço do Big Mac em diferentes países, faz-se a conversão cambial desses valores e se aponta quanto cada moeda nacional está sub ou sobrevalorizada em relação ao dólar. Muito bem. Tempos atrás, um professor australiano mandou uma carta para a revista dizendo que tinha feito com seus alunos outro exercício baseado no Big Mac: eles calcularam quantas horas de trabalho de um empregado do Mac Donald´s eram necessárias em cada país para comprar… um Big Mac. Nem é preciso dizer quão monumental era a diferença entre, por exemplo, o Canadá e as Filipinas. De minutos para horas. O professor australiano revelou, na prática, o calcanhar de Aquiles do índice. Para este leitor que vos escreve, nunca mais foi possível pensar numa faceta do cálculo sem levar em conta a outra.