A propósito da decisão da Câmara de proibir a divulgação de pesquisas a partir de 15 dias das eleições, a Folha publica hoje o duro editorial ‘Câmara escura’.
Foi o único jornal a opinar sobre o caso.
Resolvi publicá-lo para enriquecer o debate. Farei o mesmo com editoriais favoráveis ao ato da Câmara.
Em todo caso, uma nova questão entrou em cena: se nem uma emenda constitucional que trata do processo eleitoral – como a que derrubou a regra da verticalização adotada em 2002 – vale para uma eleição, se aprovada a menos de um ano de sua data, como decidiu ontem o Supremo, me parece que tampouco deve valer para este ano a lei ordinária que inclui a mordaça nas pesquisas, cuja tramitação, por sinal, ainda nem terminou.
Ao editorial:
Quando parecia que o Congresso Nacional já desistira das mais estapafúrdias receitas de reforma política, a Câmara dos Deputados decidiu aprovar o dispositivo que proíbe a divulgação de pesquisas eleitorais nos 15 dias que antecedem o pleito. A proibição é o maior abuso contido no projeto de lei que, a pretexto de reduzir os custos de campanhas eleitorais, veda propaganda em bonés, broches e camisetas. A proposta deverá ainda ser votada no Senado Federal.
Não passa de um equívoco o argumento de que restringir a divulgação de pesquisas contribui para aprimorar o processo eleitoral. A medida priva o eleitor do acesso a informação relevante para decidir seu voto. O caminho para melhorar a qualidade do pleito é o oposto: passa pela ampliação das fontes de notícias à disposição do público que vai às urnas.
A censura prévia de pesquisas viola a liberdade de expressão e o direito à informação, cláusulas pétreas da Carta. Instituí-la equivale a expor a opinião pública a uma onda de ‘sondagens’ e pesquisas de origem anônima e qualidade duvidosa. Como os políticos jamais vão prescindir de realizar as suas pesquisas, o único personagem dessa história entregue à desinformação será o eleitor -exatamente aquele a quem cabe escolher os governantes.
O que o poder público deve fazer a respeito das pesquisas não é mais do já tem feito. Cabe-lhe exigir o registro prévio das sondagens na Justiça Eleitoral, a indicação do seu contratante e de sua metodologia e a entrega de cópias do questionário a ser aplicado. São requisitos assentados no bom senso e suficientes para que haja um controle eficaz e transparente dos institutos.
É inconstitucional e injusta a tutela que a Câmara tenta impor ao eleitorado. A título de produzir uma resposta de faz-de-conta à crise de credibilidade que se abate sobre o Parlamento, os deputados não têm o direito de lançar mais sombra na disputa eleitoral. É preciso mais luz. Por isso, o Senado deve recusar-se a endossar esse atentado à Constituição.
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