Na cobertura da “maior investigação da história do Congresso”, como o Globo classifica o desvendamento do escândalo dos sanguessugas, a Folha está vários corpos de luz à frente da concorrência.
A leitura da sua edição de hoje cobre de razão os críticos de mídia que acham pouco, muito pouco, o tipo de jornalismo que antigamente se chamava taquigráfico e hoje talvez mereça ser chamado jornalismo copiar-colar.
No caso dos sanguessugas, isso tem significado obter de policiais, procuradores e políticos os nomes, cifras e fatos e vazados pelo capo Vedoin, o traficante de ambulâncias superfaturadas, em seus 10 dias de torrenciais depoimentos à Justiça Federal, no esquema da delação premiada.
Isso é o mínimo dos mínimos. Até porque nenhuma dessas fontes se recusa a colaborar com o reportariado, desde que não sejam identificadas – afinal, o processo já aberto no Supremo Tribunal contra pelo menos 57 vampiros corre em sigilo de Justiça.
Agora, nenhum jornal, exceto a Folha, foi atrás, por exemplo, de uma história que estava quicando na pequena área – a do alegado envolvimento na maracutaia do então deputado paulista Émerson Kapaz, um dos porta-bandeiras da lisura nos negócios e na política. Atualmente, ele preside o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial.
Quando o seu nome emergiu semana passada, a mídia se limitou a registrar burocraticamente o seu enérgico desmentido – e deixou pra lá. Garimpando, porém, a repórter Catia Seabra chegou à ex-mulher do empresário e dela extraiu a confissão de que a Planam, a empresa de Vedoin, depositou, sim, dinheiro na conta dela.
Mais importante do que isso, a Folha já conseguiu apurar as acusações contra 75 dos 90 parlamentares e ex-parlamentares que constam das listas incriminadoras.
E mais importante ainda, as repórteres Luciana Constantino e Marta Salomon revelam que em novembro de 2004 a Controladoria Geral da União alertou por escrito o então ministro da Saúde Humberto Costa das fraudes na compra de ambulâncias para municípios, a partir de emendas parlamentares ao Orçamento da União.
Um mês e tanto depois, o ministro criou um grupo de trabalho para checar a advertência. O grupo de trabalho só começou a funcionar em março de 2005. E só em maio passado, quando a Polícia Federal desencadeou a Operação Sanguessuga, a Saúde suspendeu os repasses dos respectivos recursos às prefeituras.
Digo que isso é importante não porque o Ministério era do PT – podem portanto os patrulheiros de sempre ficar sossegados. Mas porque a história mostra como funciona o poder público no Brasil, qualquer que seja o partido no seu controle.
Ou, nas palavras de um jornalista que sabia usá-las, como se move o sossegado corpanzil da burocracia.
Ponto também para a Folha pelo editorial “Infestação”, que cobra da CPI “maior publicidade às acusações e qualificá-las de modo mais preciso”, para o eleitor interessado saber quem, dos que lhe disputam o voto em outubro, fez exatamente o que nessa sórdida operação criminosa.
Se a Folha pode ir além das listas e procedimentos vazados, o que os seus competidores igualmente taludos estão esperando para fazer a sua parte?
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