Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Não tirem Denise das manchetes

Nem o mensalão no Supremo, nem os resultados da perícia nos papéis de Renan Calheiros. A personagem mais notícia desses dias, que só o Globo, dos três grandes jornais brasileiros, teve a argúcia jornalística de catapultar para a sua manchete, é a senhora Denise Abreu, diretora da Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac.

Menos, talvez, pelo fato específico que determinou a sua promoção ao lugar mais vistoso do que alguns chamam erroneamente de capa – quem tem capa é revista, jornal tem primeira página – do que por uma denúncia que deixou estarrecido o país ainda de luto pelos 199 mortos do Airbus da TAM.

O fato específico foi a decisão da CPI do Apagão Aéreo do Senado de quebrar os sigilos bancário, fiscal e telefônico de dona Denise. Numa entrevista ao Globo, ela tinha sido acusada pelo ex-presidente da Infraero, José Carlos Pereira, de favorecer um amigo num negócio de transferência de cargas de Congonhas para Ribeirão Preto.

Na CPI, Pereira amarelou, dizendo que não disse exatamente o que o jornal lhe atribuiu, mas, nas circunstâncias, os senadores fizeram o que tinham de fazer.

Mas o que deveria manter madame Denise nas manchetes foi a revelação da juíza federal Cecília Marcondes, em entrevista à Folha, de que foi enganada por ela – e essa enganação tem ligação direta com a catástrofe de Congonhas.

Em fevereiro, a diretora da Anac apresentou à desembargadora um documento – que supostamente seria uma norma de segurança adotada pela agência – segundo o qual o pouso em Congonhas, de aviões de grande porte com reversor inoperante, mesmo quando as pistas estivessem molhadas, não oferecia riscos.

Com base nesse documento, que não era norma coisissima nenhuma – uma fraude, portanto -, a juíza reverteu decisão de primeira instância proibindo tais operações.

Se Denise não mentisse, a desembargadora provavelmente ratificaria a decisão judicial anterior. E no fatídico 17 de julho, ou o Airbus defeituoso, vindo de Porto Alegre, teria de pousar em Guarulhos, ou a TAM teria usado outro avião que estivesse nos conformes.

Ora, a quem interessava que Congonhas continuasse a ser usada pelos grandes aviões, chovesse ou fizesse sol, com os reversores em ordem ou desordem?

Até os carregadores de bagagem dos aeroportos brasileiros sabem que a Anac tem parte – e que parte! – com o duopólio TAM-Gol que domina a aviação comercial brasileira desde a quebra da Varig.

Hoje está em todos os jornais a acusação da desembargadora Marli Ferreira, presidente do Tribunal Regional Federal onde atua a colega Cecília:

“O Tribunal foi fraudado na sua obrigação constitucional de dizer o direito na sua forma reta, justa, moral, equitativa para o cidadão. E o resultado são 200 mortes. E o nosso choro como cidadãos, e não mais como juízes, se faz ecoar em todo o país, por falta de responsabilidade administrativa desses administradores que desservem à nação.”

Para ela, a apresentação documento que não era o que parecia, “foi uma atitude impensada, ilegal, que abusou do poder de regulamentar, do Poder Judiciário e se vestiu de inconstitucionalidade à medida que manifestou a vontade do Estado de forma não-verdadeira, inverídica. Foi uma afirmação falsa.”

***

Os comentários serão selecionados para publicação. Serão desconsideradas as mensagens ofensivas, anônimas, que contenham termos de baixo calão, incitem à violência e aquelas cujos autores não possam ser contatados por terem fornecido e-mails falsos.