Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

No lixo, em Araraquara

Da série “Sem entender o que acontece nos presídios os jornais não informarão direito e o público não entenderá por que há rebeliões e terreno fértil para grupos criminosos organizados”. Reportagem de Cláudio Dias, da Tribuna Impressa, de Araraquara (10/8).


No lixo, prontuários dos presos

Mulheres dos presos vasculham o lixo à procura de prontuários e roupas; no detalhe, mulher mostra documento de um parente


Daniel Barreto



Daniel Barreto



Cláudio Dias


Alguns prontuários dos presos da Penitenciária de Araraquara foram encontrados ontem por um grupo de esposas dos detentos jogados dentro da área do lixão. No local ainda havia roupas e cartas em bom estado. Parte do material está danificado e não tem condições de ser utilizado, mas um outro montante está quase intacto. Na rebelião de junho, os detentos queimaram documentos referentes a processos incompletos arquivados no Fórum.

A maior parte dos documentos é de consultas médicas dos presos, mas existem muitos outros prontuários com fotos e dados cadastrais. Um tal Gilberto, por exemplo, ingressou no presídio em 2003 vindo de Junqueirópolis. Ele cumpre pena por roubo, tráfico e homicídio. A ficha com foto estava no lixo. Esse material é utilizado para o pedido de benefício dos internos, como a mudança de regime do fechado para o semi-aberto. Atualmente, uma equipe da Corregedoria Geral da Justiça analisa mais de 500 pedidos deste tipo no Fórum.

Entre as várias mulheres que catavam os materiais em meio ao lixo estava a comerciante Claudinéia de Lima Campos, cujo marido está preso por latrocínio. Indignada com a situação, ela não aceitava cada vez que encontrava além dos documentos roupas, chinelos e lençóis. ´Não dá para acreditar que eles passaram frio com tanta coisa jogada aqui´, diz a moça, vendo umas das colegas resgatar uma roupa de cama dada ao marido. Uma outra jovem lembra que encontrou a ficha do esposo e que a entregará ao advogado. 


Testemunha da procura pelos papéis, o catador de lixo Adriano Aparecido de Souza Santiago diz não ter entendido por que roupas e chinelos novos estavam sendo jogados no lixo. ´Eu mesmo estava vendo essas coisas [prontuários], mas não sabia se eram importantes´, conta o rapaz. Ele mostrou à reportagem chinelos, lençóis, cartas, fotos e muitos outros objetos dos presos que foram deixados no lixão. É verdade que parte do material estava destruído, mas também existiam peças em bom estado de conservação.


Roberto Fiori, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), diz que orientou as mulheres a esconderem os prontuários e os demais documentos. Ele vai fotografar tudo ainda esta semana e encaminhará um oficio à Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) pedindo esclarecimentos sobre o caso. ´Queremos apenas saber se esses prontuários foram refeitos, porque não deveriam ter sido jogados fora´, disse. A reportagem não conseguiu falar com a SAP pelo telefone, ontem à noite.”


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