A repórter Carolina Mandl registrou no Valor da segunda-feira, 1, observações de três pessoas que se aglomeravam no Pátio do Forró, em Caruaru, Pernambuco, para a famosa festa de São João da cidade, no sábado à noite.
No camarote, ao fim de uma escadaria de 40 degraus, estava a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.
“Eu já ouvi uns CDs dela”, confundiu-se uma vendedora. “É a secretária de Lula”, chegou mais perto um garçom. “É aquela que está com câncer?”, perguntou uma faxineira que não tinha ligado o nome à pessoa até que a repórter esclarecesse que falava da ministra que estava doente.
Os três fazem parte do universo de brasileiros que ou nunca ouviram falar nela (26% dos entrevistados numa pesquisa do Instituto Sensus), ou não sabem de sua doença (35% no Datafolha) ou desconhecem que ela é a candidata do presidente Lula à sua sucessão (54% no Vox Populi).
Quando saiu esse último levantamento, o primeiro da atual fornada, o blogueiro falou de sua perplexidade com o fato de que, mesmo depois de o problema de saúde da ministra e a sua condição de candidata de Lula terem sido amplamente noticiados na TV, fosse ainda elevada a parcela do público alheia a uma coisa ou outra.
O drama humano, a forte carga emotiva de uma palavra que muita gente nem sequer gosta de pronunciar, a circunstância de que no centro da notícia está uma mulher e a sua associação com o presidente que continua batendo recordes de popularidade, tudo devia ter chamado a atenção de muito mais gente.
Isso não ter acontecido indica que não adianta a informação simplesmente estar disponível na mídia de mais amplo espectro: para aqueles setores do público que não a registrarem, é como se não existisse. Deve haver pencas de razões que expliquem, caso a caso, por que uma notícia passa e outra, sobra. Seja lá o que tenha feito a diferença no caso Dilma, o índice de desatenção é significativo.
O debate sobre a atuação da imprensa geralmente parte do princípio de que o que sai no jornal, é dito no rádio ou mostrado na TV chega ao seu destino instantaneamente, ou, na pior das hipóteses, de um dia para o outro. Se isso não é verdade, ou se as pessoas levam mais tempo para se apropriar das informações ao seu alcance, a questão muda de figura.
Afinal, como dizia o sociólogo Paul Lazarsfeld (1901-1976), um dos primeiros teóricos da comunicação de massa, todo estudo de mídia é um estudo sobre os seus efeitos.
Naturalmente, de que adianta criticar um órgão de imprensa pelo modo como transmite, analisa e julga os acontecimentos se a platéia não está, como se diz, nem aí para o seu trabalho?
Mas o assunto aqui é a percepção da doença e da candidatura da ministra. E nesse sentido o dado que se destaca em primeiro lugar é que a mídia tem sido fidedigna ao relatar as atitudes e as palavras de Dilma na sua presente situação.
De outro modo, 81% dos entrevistados do Datafolha que tomaram conhecimento de sua adversidade não diriam que ela agiu bem ao abrir o jogo a propósito. Tamanha convergência de opiniões é um incentivo para Dilma continuar sendo franca (até onde isso é possível nas circunstâncias) com o público – e para a imprensa mantê-lo informado com objetividade.
Pode-se apenas especular sobre a influência da conduta da ministra para a imagem que as pessoas estejam formando a seu respeito, à medida que se informam do seu estado, e para a influência dessa imagem nos resultados das pesquisas de intenção de voto que mostram uma alta expressiva de sua popularidade.
Sabe-se somente, pela própria ministra, das manifestações de solidariedade que ela tem recebido de pessoas do povo.
No Datafolha divulgado domingo, Dilma foi escolhida por 16% dos entrevistados (ante 11% em março) na lista de candidatos que lhes foi apresentada. Com isso, a vantagem do governador José Serra sobre ela caiu de 30 para 22 pontos.
No levantamento do Instituto Sensus, divulgado no dia seguinte, Dilma foi preferida por 23% (ante 16% em março), o que estreitou o favoritismo de Serra de 30 para 17 pontos.
Valham o que valerem tais pesquisas a cerca de 16 meses da eleição, quando a grande maioria do eleitorado ainda está longe de ter consolidado o seu voto.
O 3º mandato e a mídia
Depois que o Datafolha apurou que a ideia de uma terceira candidatura consecutiva de Lula ao Planalto divide o país (49% contra e 47% a favor), vem ao caso lembrar da reação do presidente quando, num evento na Bahia, na segunda-feira da semana passada, ouviu do público um pedido para que promovesse um plebiscito sobre o terceiro mandato. Ele apontou para os jornalistas presentes e devolveu: “Fala isso para a imprensa.”
Talvez tenha sido o seu maior elogio – embora involuntário – à mesma imprensa da qual chegou a dizer que lhe dava azia.