O título da reportagem do O Estado de S.Paulo de hoje – ‘Relatório do Merrill Lynch preocupa imprensa’ – pode induzir que se trata de problema que acaba de nascer, apesar de já estar na adolescência. O texto trata de um relatório do banco de um dos maiores bancos de investimento do mundo com novos prognósticos de futuro difícil para os jornais impressos – e, conseqüentemente, para suas empresas controladoras.
O ‘alerta’, segundo o Estado, ‘causou certo alarme’, entre outros motivos, porque partiu de uma analista do banco, Lauren Rich Fine, que sempre defendeu a tese de que os jornais impressos iriam superar a crise ‘em meio às transformações impostas pelas novas tecnologias da informação’. Lauren está pessimista com a evolução dos números. Nos últimos dez anos, segundo estima, a indústria de jornais de papel perdeu US$ 9 bilhões em anúncios classificados nos últimos dez anos, com a agravante de que US$ 2 bilhões desse total migraram para as versões dos jornais na web. ‘Projeção da Merrill Lynch’, acrescenta a reportagem assinada pelo correspondente Paulo Sotero, ‘indica que a margem de lucro da indústria, que já descontenta os acionistas em sua faixa atual de 20%, deverá chegar a 16% em 2011’.
O setor exige respostas mais rápidas do que as adotadas até agora, ela prega, entre outras alterações no modelo comercial atual, como a concessão de maior espaço para o chamado ‘jornalismo cívico’, produzido por cidadãos comuns, e a oferta de serviços, além de acesso gratuito às versões on-line e maior investimento em jornalismo investigativo.
Moscas, pilhas e embrulho de peixe
A previsão da Merril Lynch confirma uma das reportagens do relatório especial da revista The Economist, de 20 de abril passado, sobre a ‘Nova Mídia’. Um dos textos, ‘Diagrame você mesmo’, trata do crescimento exponencial dos blogs noticiosos, do fortalecimento do ‘jornalismo interativo’ e do surgimento do jornalismo cívico, cujo nascimento deu-se por meio da participação de cidadãos comuns na cobertura de eventos como o ataque da al-Qaeda em Londres e o tsunami na Ásia. O texto, depois de dar alguns exemplos de sucesso de audiência de blogs informativos, abre para avaliações sobre o futuro do jornalismo impresso. Joseph Epstein, colunista da Commentary, que se identifica como ‘a primeira revista mensal de opinião dos Estados Unidos’, diz: que, entre os jornais disponíveis nas bancas, pouco pode ser dito a seu favor além de não requerer o uso de pilhas, servir para espantar moscas e serem usados para embrulhar peixe’. Philip Meyer, autor do livro ‘O jornal desaparecido’ não esculhamba o meio, mas não é menos trágico em sua previsão de que, em abril de 2040, ‘o último leitor reciclará o último exemplar de jornal impresso existente’.
Outro detalhe, não acentuado pela reprodução parcial do relatório publicado no Estado, é que, além da queda continua das tiragens dos grandes jornais norte-americanos desde o início da década de 90, os jornais tradicionais dos EUA estão com sua credibilidade no chão. Casos como o de Jayson Blair, que simplesmente inventou várias reportagens publicadas no The New York Times, por exemplo, minaram definitivamente o argumento comercial de que jornais impressos ‘são mais confiáveis’ do que os eletrônicos.. A reportagem da The Economist cita ainda que o último levantamento do anuário ‘The State of the News Media’ aponta a demissão de 3.500 jornalistas nos EUA desde 2000, cerca de 7% do total.
Transferindo a questão da credibilidade para o Brasil, Venício A. de Lima, neste OI, em 9 de maio passado, chamou a atenção para os números apresentados por uma pesquisa divulgada pela rede inglesa BBC e pela agência Reuters, segundo a qual 45% dos entrevistados brasileiros confiam nos meios de comunicação, contra 30% que consideram o governo confiável. ‘O que de fato chama a atenção’, observou Lima, ‘é que mais da metade dos entrevistados – ou 55% – tenham dito que não confiam nas informações obtidas através da mídia. Entre todos os países pesquisados, esse percentual é igual ao da Coréia do Sul e só não é maior do que o obtido na Alemanha (57%)’.
Em sua avaliação no artigo ‘Pesquisa revela a (des)confiança na mídia’, Venício A. de Lima chama a atenção:
‘Uma primeira constatação que se pode fazer é que, considerando o período em que a pesquisa foi realizada – 11 meses depois do início do ‘escândalo político midiático’ e das revelações diárias, na grande mídia, de denúncias de corrupção envolvendo genericamente ‘o governo’ – não é de surpreender que apenas 30% dos entrevistados manifestassem confiança no governo. Ao contrário. Talvez se possa até mesmo dizer que esse percentual é surpreendentemente elevado’.
Link para a íntegra de Pesquisa revela a (des)confiança na mídia