O prefeito Cesar Maia publicou hoje em seu ‘ex-blog‘ instruções para participantes do debate de hoje à noite televisão. Quase todas são dirigidas a todos os candidatos. É como se fosse um strip-tease da verdadeira natureza desse capítulo do circo eletrônico. Essas observações deveriam ser divulgadas para o maior número possível de eleitores.
‘1. [….] Nossa senadora Heloisa Helena deveria levar esses pontos para o camarim. Trata-se de experiências de debate em eleições em outros países, especialmente nos EUA.
2. Debate ninguém ganha. Mas pode-se perder. Quem escorregar feio pode perder. Quem o derrubou não vai ganhar, é ilusão. Mas quem escorregou pode perder. Portanto, tocar um bom realejo, e falar umas abobrinhas são garantias de que não se vai perder nada com o debate. A memória dos debates dura 48 horas. A menos que venha uma derrapada. Não se arrisque.
3. TV é imagem. Uma maquiagem bem feita e suave, uma boa combinação com o cenário, uma roupa escura para emagrecer (HH nem precisa) e um rosto suave, denotando tranqüilidade e conhecimento de causa (mesmo para falar a maior besteira).
4. Não arredonde os números: use os números reais quebrados, que têm muito mais credibilidade.
5. Quando se faz a pergunta se deve perguntar a si mesmo. Quem fala por ultimo leva vantagem na TV. Nesse caso quem responde tem a tréplica. Pergunte algo insípido e técnico num campo que você domina bem, e em sua réplica dê uma aula.
6. O eleitor não gosta do visual de briga ou raiva. Quando for atacar o faça com máxima dureza no conteúdo e uma natural suavidade na forma. Ouça uma fita de discurso de Carlos Lacerda antes de ir para a TV.
7. Nos intervalos os assessores devem não dar dica alguma. Não mande assessores técnicos falarem com o candidato. Só atrapalham. Deve ir alguém de imagem, a maquiadora, e um amigo. A pessoa de imagem corrige detalhes formais. A maquiadora ajusta o cabelo e tira o suor. E o amigo diz que o candidato está dando um banho, levantando sua energia.
8. Leve um parágrafo – e nada mais – para cada pergunta e resposta sobre os temas que a TV Globo vai sortear. E improvise com seu realejo sobre eles.
9. Sobre os escândalos, vá colocando cacos em suas perguntas e respostas com os outros candidatos que não Lula, sem citá-lo de forma a não ter direito de resposta. Se ele entrar, colocou a carapuça.
10. Se for tratar dos escândalos com Lula, diga que está na hora dele se explicar ao povo brasileiro e ofereça o tempo para ele falar o que quiser a respeito. E comente em nome do eleitor.
11. Lembre que o perfil de quem está vendo a TV é diferente do perfil do eleitor: pende bem mais para a classe média.
12. Lembre que a audiência é bem maior nos dois primeiros blocos.
13. Quando olhar para a câmera, fale com o eleitor e não com quem fez a pergunta.
14. Não discuta com o apresentador. Ele tem muito mais credibilidade que você e quem assiste se projeta nele.‘
***
Adendo em 29 de setembro, 9h32.
Não houve no ‘debate’ da Globo nada do que é descrito acima (ver ‘Professor Bonner‘, no programa de rádio desta sexta-feira, dia 29). Anticlímax completo. De todo modo, vejamos o que escreve hoje Cesar Maia em seu ‘ex-blog’:
‘1. A ´assistência´ ao debate soma a transmissão direta e a cobertura – durante o dia e no dia seguinte. Lula preferiu o desgaste de não ir. Na maioria das vezes a simples repetição dos casos de corrupção não agrega fato novo. O ponto seria dizer por que ele não foi (porque não tinha como se explicar ali). Foi feito mas poderia ter sido mais focado. A tendência anterior de Lula perder algo e dos demais crescerem foi reforçada.
2. Noblat: DEBATE – O ibope foi bom. Deu 38 pontos de audiência o primeiro dos cinco blocos do debate entre os candidatos a presidente promovido pela Rede Globo. No terceiro bloco a audiência foi de 28 pontos. Esses números não são oficiais. Na média o pessoal da Globo calcula que a audiência foi de 30 pontos, considerada excepcional para o horário. [Eis aí um dado que eu, Mauro, gostaria de ver contestado, em benefício dos telespectadores: o programa foi chatíssimo. Vide ponto 4, adiante. Será que o Brasil está ficando parecido com a Suíça, onde há cidadãos capazes de se interessar sinceramente por questões tão chatas? A verdade é que estava tudo preparado para uma luta de vale-tudo, mas um dos contendores não foi…]
3. Falha geral: política externa sequer foi abordada. Nada! Seria um bom momento para colar Lula com Cháves e Morales e mostrar os riscos quanto ao futuro. [Se for para contabilizar as ‘falhas gerais’, falta tanta coisa…]
4. Não foi diferente da campanha: os candidatos falam de coisas que são de prefeito e governador, para atingirem o eleitor mais pobre.
5. Heloisa Helena esgotou seu repertório no primeiro bloco. A sua fala final – que quis dar um tom comovente – foi mais um discurso de despedida de aeroporto.
6. Alckmin sempre perfeito, sempre preparado, sempre horizontal. O melhor tecnicamente, de longe. [Levando-se em conta seus companheiros de picadeiro, pode até ser.] Até no caso da segurança se saiu bem e tirou o PCC da frente em pergunta de HH. [Alckmin só se poderia se sair bem na segurança se a audiência fosse de marcianos. Isso pressupondo que os marcianos sejam menos inteligentes do que os humanos.]
7. Cristóvam: foi quem tirou o melhor proveito político, seja em relação a Lula, seu governo e a abordagem da ausência, como em relação a seu monotema. Teve a vantagem de seus adversários o tratarem com distinção. Soube falar a seu eleitor potencial, na pergunta sobre os militantes do PT. E fez um competente chamado ao segundo turno Problema: uma dicção um pouco fechada.’ [Essa da dicção ‘um pouco fechada’ é engraçada: uma jovem que assistia ao debate ao meu lado, e não sabe quem é Cristovam, questionou: ‘Ele é português! Candidato português pode concorrer a presidente do Brasil?’]
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