Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O leitor patrulheiro assusta editores


A julgar pelo número de comentários e pelas polêmicas surgidas em weblogs e páginas jornalísticas na Web, os eleitores de classe média nas principais cidades brasileiras já elegeram a internet como o arena política preferencial.


A campanha para o segundo turno das eleições presidenciais revelou também um outro fenômeno capaz de provocar antagonismos sérios e polêmicas não menos apaixonadas. Trata-se do patrulhamento de jornalistas e formadores de opinião por cidadãos com acesso á internet.


A Web oferece a um número cada vez maior de pessoas a possibilidade de expressar seus pontos de vista, ressentimentos e conhecimentos para audiências que também não param de crescer.


Como acontece noutros países, especialmente nos Estados Unidos, a grande maioria dos novos protagonistas da arena política dedica uma atenção especial à cobranças de todos os tipos aos jornalistas que detém espaços informativos, tanto na imprensa escrita como na online.


O patrulhamento rompe, pela primeira vez na história da imprensa, com a tradicional unidirecionalidade do fluxo informativo. Até agora, quase toda a informação fluia dos tomadores de decisões e formadores de opinião, através dos jornalistas, até o público, cujo poder de retroalimentar o circuito informativo era muito limitado.


O rompimento ocorre em circunstâncias traumáticas, especialmente para os jornalistas, que passam a se sentir encurralados e hostilizados por uma massa de leitores que estraçalha reportagens e comentários com um ímpeto também inédito na história do jornalismo brasileiro.


Quem lê os comentários postados em weblogs e páginas políticas online percebe rapidamente que a esmagadora maioria dos comentários revela uma atitude ácida em relação à imprensa. A argumentação quase sempre responde ao impulso e à paixão, o que provoca ressentimentos dos patrulhados.


Esta mesma sensação foi experimentada por jornalistas norte-americanos de todos os matizes na campanha eleitoral de 2004, como mostram dois textos (Watchblogs, a nova patrulha da imprensa e A vitória dos ‘jornalistas de pijamas’ ) que escrevi, na época, aqui no Observatório.


É compreensivel a reação dos profissionais, mas a melhor alternativa para evitar a intensificação do patrulhamento e a vilanização da imprensa é procurar entender a natureza do processo em curso, onde a ascensão do leitor como protagonista informativo é irreversível.


O leitor trás para os comentários que posta em blogs a páginas web uma enorme carga de frustrações e ressentimentos acumulados ao longo de anos de impotência informativa criada por uma imprensa unidirecional. É inevitável que a catarse seja ampliada, também, pela falta de experiência prévia no diálogo público num veículo novo como a internet, onde as regras de convivência social ainda estão sendo desenvolvidas.


Os períodos pré-eleitorais e as crises políticas oferecem um terreno muito fértil para o maniqueismo e passionalismo políticos. A imprensa inevitavelmente acaba envolvida neste clima e pelo que se pode ver na campanha do segundo turno, não conseguiu imunizar-se contra os mesmos processos que ela criticou nos eleitores.


É fácil prever que nos próximos anos a arena informativa virtual continuará marcada por aquilo que muitos classificam como ambiente caótico. O comportamento dos internautas mais experientes tende a assimilar as novas realidades do diálogo político online, mas ao mesmo tempo novas levas de neófitos estarão ingressando na arena cibernética mantendo a sensação de caos, desordem e anarquia.


Portanto não resta aos jornalistas outra alternativa senão procurar assimilar a nova situação. A mudança de atitudes dos consumidores de informação é irreversível porque está sendo impulsionada por inovações tecnológicas igualmente irrevogáveis. Assim resistir à mudança é quase um sinônimo de suicídio.