A Fox News, a emissora americana de jornalismo 24 horas no ar que é a mais facciosa do gênero, descontadas as estações estatais das ditaduras, tem um slogan irretocável: ‘Fair and balanced‘, equânime e equilibrada.
É o que devem desejar que sejam os órgãos de mídia a que recorrem os consumidores de informação, menos, naturalmente, aqueles que sintonizam tal ou qual emissora e lêem tal ou qual periódico apenas para encontrar neles o conforto psicológico da reafirmação de suas crenças e preconceitos.
Isto posto, hoje é dia de perguntar se os grandes jornais brasileiros foram equânimes e equilibrados nas notícias, análises e editoriais sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) anunciado ontem em sequência pelo presidente Lula, os ministros Guido Mantega, da Fazenda, e Dilma Roussef, da Casa Civil.
A resposta que me ocorre pode dar a impressão errada de ser escrita em cima de um muro. Seja como for, é um ‘sim, mas nem sempre’.
A premissa embutida nessa avaliação é a de que, sem prejuízo da equanimidade e do equilíbrio, por princípio a atitude da mídia em relação a tudo que vem de todo e qualquer governo deve ser no mínimo cautelosa e no máximo cética.
Não chego a ponto de achar que ‘imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados’, na célebre frase de Millôr Fernandes, mas sem uma saudável dose de perspectiva crítica não se faz jornalismo, principalmente e antes de mais nada quando os personagens centrais do fato jornalístico são os poderosos de turno.
Apresso-me a acrescentar que o meu ‘sim, mas nem sempre’ é um julgamento superficial: tudo somado, a Folha, o Globo, o Estado e o Valor puseram nas bancas 118 textos (editoriais incluídos, infográficos excluídos) sobre o plano econômico do segundo governo Lula.
Uma análise exaustiva desse conteúdo (levando em conta necessariamente a forma de publicar as notícias e opiniões que induzem o leitor a ser menos ou mais favorável à iniciativa do governo) renderia um belo trabalho de conclusão de curso de jornalismo ou, quem sabe, até uma tese de mestrado.
Ainda mais se incluísse no estudo o Jornal Nacional da Rede Globo, cuja audiência é muitíssimo maior do que a circulação somada dos diários citados. Por sinal, para medir a profundidade da cobertura do lançamento do PAC no JN bastaria um palito de dentes.
Mas vejam como são as coisas. A Folha deu a manchete menos equânime e equilibrada sobre o PAC: ‘Plano de Lula é criticado por empresários e governadores’. É uma meia-verdade comparável à imaginária alternativa ‘Plano de Lula é elogiado por empresários e governadores’.
No entanto, o leitor da mesma Folha encontrará na página seguinte um editorial intitulado ‘Certo, mas pouco’, objetivo e sensato, concorde-se ou não com os seus argumentos.
Melhor, nesse sentido crucial, do que o esperado ‘O novo espetáculo do crescimento’, do Estado, ou o surpreendentemente agressivo ‘PAC traz uma redução pífia de tributos e mais gasto corrente’, do Valor. O Globo intitulou o seu editorial ‘Aposta arriscada’ e empatou, no texto, com a moderação da Folha.
Não quero dizer com isso que determinado editorial é ‘mais certo’ do que outro. O critério de análise é, em cada caso, a adequação entre fatos e juízos de valor, de um lado, e a proporção de adjetivos, advérbios e substantivos do texto – quanto mais dos últimos, melhor.
Mas um assunto tão complexo como o programa desenvolvimentista de Lula exige que em algum lugar, de preferência não enfurnado no pé de uma página, o leitor encontre uma síntese a partir da qual ele possa guiar-se na leitura de tudo mais – e formar opinião com razoável fundamento.
O que há de mais parecido com isso são os textos que resultaram da conversa que o ministro Mantega teve ontem com um seleto grupo de ‘jornalistas com redação própria’, como se fala nas redações dos que assinam colunas e matérias analíticas.
Recomendo os seguintes: ‘Contas só fecham se a economia crescer 5% a partir de 2008’ (especialmente os dois parágrafos finais), de Ribamar Oliveira, no Estado; ‘Medidas preservam a essência da era Palocci’, de Cristiano Romero, no Valor, e ‘PAC se diferencia pela vontade política, afirma Mantega’, de Guilherme Barros, na Folha.
Agora, no quesito ‘pior de tudo’ não há disputa. O prêmio ignóbil vai para o título da coluna Direto da Fonte, de Sonia Racy, no Estado: ‘A montanha pariu uma paca’ – sem aspas no original. Lendo, se descobre que a grossura é do cientista político Murilo Aragão, que trabalha para a consultoria Arko Advice. Lendo mais ainda se descobre que a responsável pela coluna de hoje não é a titular, mas a interina Silvia Penteado.
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