O presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti, deu uma entrevista pornográfica à Folha de S.Paulo.
Está na edição de hoje. Ele disse que os políticos que conseguirem provar que se abasteceram no PTduto [a expressão é do colunista Clóvis Rossi] para pagar dívidas de campanha pelo caixa 2 não devem ser cassados.
A sua “posição pessoal” [sic] é que uma coisa é receber dinheiro do partido do governo para apoiar o governo; outra, “menos grave”, é receber dinheiro – pelo visto, de quem quer que seja – para acertar a vida com que ajudou os recebedores a se eleger.
São duas as prováveis e entrelaçadas explicações para a cínica distinção, como se o uso do caixa 2 em política não fosse crime. Eleitoral, mas crime.
A primeira, para recorrer a um tremendo de um eufemismo, é a própria “filosofia” do coroado rei do baixo clero. O que ele disse ontem é coerente com que ele fez na política a vida inteira.
A segunda explicação é mais específica. Mais de uma vez saiu na mídia que o deputado José Janene, líder na Câmara do mesmo PP de Severino, ameaçou levar consigo o presidente da Casa, entre outros, se for cassado.
Contra Janene pesa a confissão do seu assessor e tesoureiro do partido, João Cláudio Genu à Procuradoria Geral da República. Ele disse que o dinheiro no qual pôs as mãos ía para o líder da bancada pepista. Coisinha R$ 4,1 milhões. Depois de amanhã Genu vai negar, digo, falar, na CPI do Mensalão.
Na entrevista imprópria para menores à Folha, Severino disse que Genu foi ao PTduto porque precisava de dinheiro “para pagar um advogado aqui de Brasília” – isto é, não para os pepistas comandados por Janene votarem com o governo. A única “falha” do partido foi “não ter contabilizado” a bufunfa.
No que depender da “posição pessoal” de Severino, nem morto Janene será cassado. As cassações são decididas em última análise em plenário – pelo voto secreto. A lâmina desce quando 257 deputados (metade mais um do total de 513) aprovam o seu acionamento.
Quantos deles não teriam os mesmos motivos atribuíveis a Severino para salvar o pescoço de Janene?
P.S. Do senador Delcídio Amaral, presidente da CPI dos Correios, também na Folha de hoje: “Se não tivermos como descobrir a origem do dinheiro [do PTduto], essa CPI será parecida com as outras, onde investigaram quem recebeu na ponta, quem usufruiu, mas ninguém levantou os agentes que garantiram tudo aquilo”. Isso é incomparavelmente mais importante do que saber se o mensalão foi mensal, bimestral, trimestral, semestral, anual ou ocasional [ver nota abaixo]. E é nisso que a mídia precisa ficar de olho.