Esta semana a agência de notícias Reuters distribuiu um texto com o seguinte título: “Ocupar Wall Street, mas primeiro, ocupar a Internet”. A agência foi muito feliz pois esta é talvez a principal explicação para o vertiginoso crescimento da visibilidade pública do protesto iniciado no final de setembro em pleno centro de Nova York contra o sistema financeiro norte-americano.
Occupy Wall Street transformou-se num código usado no Twitter, páginas Web, dezenas de fóruns online, vários perfis na rede social Facebook e um sem número de blogs pessoais ou coletivos. No Zuccotti Park, em frente à bolsa de Nova York, a multidão de jovens, e outros nem tanto, já chegou a cinco mil, mas há quase dois milhões de norte-americanos acompanhando o protesto pela internet.
A webificação do movimento confirma o que já vem acontecendo em várias partes do mundo em matéria de manifestações politicas. A parte presencial, gente na rua, é talvez a menor de todas entre os que cobram mudanças no sistema financeiro. É uma especie de exército de reserva, que pode ir também para a rua, caso algo extraordinário aconteça.
É também um protesto que expressa mais raiva, frustração, irritação e desilusão do que uma proposta política clara. Ocupar Wall Street , ou OWS, a sigla cada vez mais comum nos cartazes, é um objetivo impossível de ser alcançado em condições normais. Sendo assim, teria todas as chances de não levar a nada mas (mais) — apesar de tudo, o número de manifestantes continua crescendo.
Logo, não é o objetivo estratégico que determina o movimento mas, sim, o estado de espírito de quem participa dele. Só isso já marca uma enorme diferença entre os movimentos pós internet e os protestos tradicionais, no quais a fixação de um objetivo é uma condição obrigatória. Outra diferença notória: não há líderes. Na verdade, ninguém se preocupa com eles. Quem está mais interessado em identificar cabeças são os jornalistas, por conta da obsessão com a personificação de qualquer evento público.
O professor de jornalismo e blogueiro norte-americano Jeff Jarvis explicou a popularidade das redes sociais, Twitter e blogs durante protestos ao comparar essas ferramentas digitais a “cartazes em branco, sem dono, onde se escreve o que se quer. É uma anarquia, pois as pessoas estão cansadas da ordem”. Ele também acha que os protestos atuais tendem a crescer porque não têm estrutura e nem programa politico.
O movimento também elegeu o slogan “99%” como metáfora para o fato de que os banqueiros e os investidores ricos de Wall Street formam menos de 1% da população norte-americana. Os restantes seriam as vítimas da explosão da bolha imobiliária de 2008 e das dificuldades atuais agravadas pela crise na Europa.
O que mais impressiona na manifestação em Nova York é que os conteúdos ideológicos perderam espaço para histórias humanas, desabafos, lágrimas e raiva pelo sofrimento e desilusões atribuidas aos banqueiros. O site Tumblr, onde as pessoas podem postar textos, abriu no sábado (1/10) espaços para usuários e em menos de quatro horas já haviam sido postadas 900 histórias de pessoas contando seus dramas. O colunista do jornal The Washington Post, Ezra Klein, definiu os depoimentos como “histórias de gente simples que seguiu as regras, fez o que mandaram fazer, e agora ficou sem nada, só dividas”.
O Zuccotti Park é a versão norte-americana da onda de protestos mundiais iniciada no primeiro semestre e que tem como marca registrada a ocupação de espaços públicos por tempo indeterminado. Em vez de marchas, acampamentos com ar de festa. Em vez de discursos, música, teatro e poesia. Para a nova geração de americanos, tem um gosto nostálgico das manifestações tipo paz e amor no final da guerra do Vietnam, nos anos 70 e uma surpreendente identificação com o estado de espírito de milhões de pessoas pelo mundo afora.