por Walter Alves*
O PT não consegue enterrar os cadáveres de dois prefeitos assassinados no estado de São Paulo. Ontem, 8/11, a viúva de Toninho do PT e a ex-namorada de Celso Daniel depuseram na CPI dos Bingos, aquela comissão de inquérito que alguns jornais chamam de ‘fim do mundo’, porque tudo nela cabe e tudo pode acontecer.
O que vale registrar é que as duas depoentes apresentaram posições e opiniões diametralmente opostas sobre os motivos que cercaram as mortes dos seus companheiros.
‘Roseana Garcia, viúva do prefeito assassinado de Campinas, Antonio da Costa Santos, o Toninho do PT, reafirmou ontem na CPI dos Bingos ter a convicção de que Toninho foi vítima de crime encomendado’, informa O Estado de S.Paulo na abertura da principal matéria sobre o assunto. O Correio Braziliense vai mais fundo: ‘A viúva sustentou que o ex-marido foi assassinado por ferir interesses de ‘gente graúda’, incluindo os de figuras importantes na história do PT, como o ex-prefeito do município Jacó Bittar, que saiu do partido em 1990’. A Gazeta Mercantil reproduz uma frase de Roseana que compromete: ‘Ele denunciou um contrato do lixo, com superfaturamento de 30%. Depois da morte dele, a redução foi para o ralo’. O Jornal do Brasil acrescenta: ‘Além de defender a tese de que a morte de seu marido teve motivação política, Roseana Garcia acredita haver um elo entre as mortes dos prefeitos de Campinas e Santo André’. O Globo e Valor Econômico vão na linha dos demais. O comum em todas as reportagens é a reclamação de Roseana Garcia de que, apesar de todas as promessas, o PT inicialmente, e o governo federal após a posse de Lula, não se empenharam na solução do crime.
A outra depoente, Ivone Santana, ex-namorada de Celso Daniel, vai na direção contrária de Roseana, segundo O Estado de S.Paulo. O jornal reproduz que ela diz ‘ter certeza de que ele [Celso Daniel] foi vítima de um crime comum’. O Valor Econômico vai além e reporta que ‘Ivone procurou desmontar diversos indícios considerados fundamentais pelo Ministério Público para classificar a morte de Celso Daniel como política’. Todos os jornais trazem que ela procurou mostrar que os irmãos do ex-prefeito, João Francisco e Bruno Daniel, eram distantes tanto de Celso Daniel quanto dos assuntos da prefeitura. Ivone ‘criticou a ‘insistência’ dos irmãos do ex-prefeito em relacionar o crime a um esquema de corrupção instalado na cidade. Eles já compareceram na mesma CPI dos Bingos – a última delas em acareação com o chefe de Gabinete do presidente da República, Gilberto Carvalho. João Francisco diz que ouviu do próprio Carvalho a história do esquema de corrupção em Santo André. O assessor direto do presidente negou com veemência.
Além de pertencerem ao PT, as duas vítimas ainda trazem outro ponto em comum: a morte de envolvidos ou testemunhas dos assassinatos. Sete pessoas relacionadas com o caso Celso Daniel morreram assassinadas ou atropeladas. Quanto ao assassinato de Toninho do PT, pelo menos dois dos suspeitos do crime foram chacinados em Caraguatatuba, litoral norte de São Paulo. ‘Segundo Roseana, a Polícia Civil de Campinas, em operação ‘ilegal’, foi até a cidade do litoral paulista e executou os rapazes’, reproduz o Valor Econômico. Outra coincidência nas palavras de Roseana: Carlos Delmonte, o médico-legista encontrado morto em situação ainda não esclarecida, em 12 de outubro passado, assinou os laudos de Celso Daniel e dos executados no litoral.
Talvez a solução definitiva de ambos os crimes nunca aconteça. Não será incomum. As estatísticas mais recentes, trazidas a público por causa do referendo do desarmamento, apontam que apenas 5% dos homicídios cometidos em São Paulo são esclarecidos. No Rio de Janeiro, esse percentual cai para 1%.
Enfim, nos dois casos, por enquanto, sobram perguntas de difíceis ou de nenhuma resposta.
Por que o PT acredita mais na versão da Polícia Civil de São Paulo e da Polícia Federal, cujos inquéritos concluíram que se tratou de crime comum, apesar das dúvidas levantadas por parentes de ambas as vítimas?
Por que o Ministério Público do Estado de São Paulo, no caso do assassinato de Celso Daniel, também não aceita as conclusões apresentadas tanto pela polícia que responde ao governo do estado de São Paulo quanto a que responde ao governo federal?
O PT, enquanto foi partido de oposição, sempre questionou o governo, fosse estadual ou federal. Por que agora não dá ouvidos às dúvidas e suspeitas apresentadas pelos parentes das vítimas? É, no mínimo, curioso não ver o PT empenhado em encontrar outras respostas. Até porque, como disse o presidente Lula em sua entrevista ao programa Roda Viva na última segunda-feira, 7/11, ‘O Celso era meu irmão. Era o mais competente administrador público em se tratando de prefeitura deste país. Toda vez que vai chegando o ano eleitoral, esse caso volta à tona’.
E como 2006 é um ano eleitoral seria lógico supor que o PT gostaria de ver estes dois cadáveres enterrados para, pelo menos, afastar a polícia da discussão política. Diante do silêncio do partido, tudo indica que os cadáveres de Celso Daniel e Toninho do PT continuarão assombrando leitores e eleitores nos próximos meses.
*Walter Alves é editor da DeFato Informação & Jornalismo