Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os desafios da sustentabilidade do jornalismo em comunidades

Este é o terceiro e talvez mais discutido item na questão da descentralização das empresas jornalísticas, em especial nas que procuram sobreviver no mercado de notícias locais ou comunitárias. Os outros dois, a tendência à segmentação na internet e o engajamento comunitário dos jornalistas foram abordados em textos anteriores (ver “Comunidades, uma opção estratégica do jornalismo” e “A imersão jornalística em coberturas comunitárias”).

As novas ideias e softwares voltados para o exercício do jornalismo se multiplicam com uma velocidade impressionante, mas na hora de pensar na sua sustentabilidade, os argumentos se confundem e muitas vezes torna-se impossível distinguir o que é novo e o que não passa de uma simples repetição de fórmulas que deram certo no passado.

O desenvolvimento de novas tecnologias e as estratégias para engajamento comunitário por parte dos jornalistas são processos relativamente simples quando comparados com o enorme quebra-cabeça sobre o que fazer para obter um retorno financeiro capaz de assegurar a sobrevivência de um projeto jornalístico em âmbito comunitário. Está claro que a descentralização e a localização das atividades jornalísticas são uma tendência irreversível gerada pela nova realidade digital na comunicação, mas só isso não garante a continuidade de um projeto, individual ou coletivo.

Além do mais, os trabalhos feitos pela pesquisadora norte-americana Penny Albernathy mostram que cada caso é um caso quando se trata de jornalismo praticado em comunidades sociais. Cada uma delas tem as suas especificidades e sua história, fatores que condicionam decisivamente a viabilidade financeira de um projeto jornalístico local. Por isso, o primeiro passo para procurar a sustentabilidade é pesquisar os valores, rotinas, comportamentos, necessidades e aspirações de uma comunidade. Quanto mais detalhada for a pesquisa, maior a chance do projeto receber a adesão dos membros da comunidade.

O jornalismo local não é um exercício de filantropia, embora ele possa ser sustentado por doações de membros da comunidade. Qualquer iniciativa só conseguirá sobreviver o suficiente para trazer benefícios para o público local se tiver um retorno que pode ser financeiro ou não. 

Financeiro quando há receitas originárias de publicidade, venda avulsa, assinaturas, doações em dinheiro ou financiamento de projetos informativos. Não financeiro, quando há troca de material publicado por serviços ou matérias-primas, como papel ou hardware. Sem retorno financeiro, a frustração é inevitável e a pior consequência é criar desconfiança em relação a futuras iniciativas de jornalismo na comunidade.

Outro desafio para empreendedores em jornalismo local ou comunitário é a transição para plataformas digitais em jornais impressos e emissoras de rádio ou TV, já existentes. Projetos novos já nascem digitais, mas os mais antigos não têm futuro sem levar em conta as novas tecnologias. Tanto quem está chegando como quem já está instalado numa comunidade enfrenta problemas de tirar o sono.

Os novos projetos se defrontam com dois tipos de dilema: o público jovem é mais receptivo à novidades mas não garante uma base financeira estável quando se trata de projetos locais com público limitado; enquanto o público mais velho desconfia das novas tecnologias e leva algum tempo para decidir pagar por informações publicadas na internet . Resultado: os novos projetos de jornalismo em comunidades têm uma maturação financeira lenta, mas quando conseguem superar a barreira do equilíbrio financeiro passam a ter maiores condições de sobrevivência porque o futuro da notícia e da informação está no digital.

De sua parte, as empresas jornalísticas já instaladas enfrentam desafios diferentes. Elas carregam a herança da era analógica como impressoras, rotativas, redes de distribuição (caminhões, venda avulsa, assinaturas, antenas, estúdios e centrais de transmissão) e uma mão de obra rotinizada e pouco disposta a se arriscar no mundo virtual. Hoje já não há muitas dúvidas de que a sobrevivência desse tipo de empresa depende da implantação de um sistema de plataformas múltiplas, com impresso e online, tanto na publicação de notícias como na estratégia de marketing e publicidade.

Pesquisas feitas por Penny Albernathy junto a jornais locais norte-americanos mostraram que as empresas organizadas em torno da produção de notícias impressas devem economizar, por ano, no mínimo 6% do orçamento em vigor durante um período de cinco anos para dispor de recursos necessários para desenvolver plataformas digitais. Isto obriga corte de pessoal, venda de prédios e equipamentos não essenciais e suspensão da distribuição de dividendos a acionistas, bem como o pagamento de altos salários para diretores.

É um remédio amargo, mas sem ele, garante Penny, só um milagre ou loteria garantem a transição para a era digital. Essa migração para um sistema de plataformas múltiplas só funciona se for acompanhada de uma nova estratégia editorial focada nas especificidades da comunidade onde a publicação está instalada, como também na reformulação do marketing e da publicidade. O jornal terá que ensinar às empresas locais como fazer publicidade online, se quiser contar com uma clientela fiel de anunciantes.