Contexto, perspectiva, equilíbrio. Contexto, perspectiva, equilíbrio. Não será por falta de oportunidade, infelizmente, que os observadores da mídia deixarão de martelar essas três regras básicas da boa informação jornalística – transgredidas dia sim, o outro também, na imprensa brasileira.
O exemplo do momento está na reportagem de página inteira no Estado de hoje sobre a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de fazer uma ‘tomada de contas especial’, como se chamam as sua investigações formais, sobre supostas irregularidades na produção, distribuição e custo dos 5 milhões de exemplares de folhetos e revistas de propaganda do governo Lula, encomendados pela Secom em 2003 a duas agências de publicidade, uma delas de Duda Mendonça.
A reportagem, dividida em quatro matérias, um quadro e um infográfico, tem ao todo 409 linhas de coluna. Apenas nas últimas nove, no pé da última matéria, vem a informação – que, justiça se faça, só o Estado traz – segundo a qual, conforme um levantamento feito por assessores do PT, ‘durante o governo Fernando Henrique foram abertas [pelo TCU] 872 tomadas de contas especiais por ano em média. E só em 1998, último ano do primeiro mandato de Fernando Henrique, foram 2.518 processos.
O jornal não revela no que deram essas tomadas, mas isso é o de menos, relativamente. O de mais é o lugar onde essa informação foi parar, quase caíndo da página. Pelo que se sabe do modo como as pessoas lêem jornal, poucas chegarão lá.
A informação é relevante porque dá contexto, perspectiva e equilíbrio à cobertura do caso. Em qualquer jornal do mundo feito como manda o manual, o dado estaria no corpo da matéria principal. Se estivesse, o leitor não seria levado a crer que a iniciativa de ontem do TCU é uma coisa que só acontece uma vez na vida e outra na morte, e se aconteceu agora é mais uma evidência de coisa feia no governo Lula.
Pelo que se conhece do caso – e o relato do Estado a respeito parece cobrir satisfatoriamente o essencial –, o TCU está coberto de razão ao ordenar – pela unanimidade dos seus membros – o inquérito e também ao trazer para a questão o Ministério Público Federal.
O TCU desconfia de superfaturamento do serviço, que talvez nem mesmo teria sido realizado por inteiro, e estranha, o que é mais do que apropriado, que a Secom tenha recorrido ao PT para distribuir parte do material, numa indigesta mistura entre governo e partido do governo, o público e o privado.
Mas, até para que não se diga que a mídia persegue o presidente, não basta dar os dois ou quantos lados tenha o assunto. As informações que claramente mais contribuam para o leitor formar opinião, venham de onde vierem, devem ser ressaltadas. Nesse sentido, deixar para o fim de tudo a numeralha sobre os processos que o TCU teria aberto no governo passado, é uma falta jornalística que não pode ser minimizada.
P.S. Vamos ver se – e quando – a imprensa contará não só no que deram as investigações formais do TCU nos governos FHC, mas também quantas já foram abertas no atual, e o seu resultado.
***
Os comentários serão selecionados para publicação. Serão desconsideradas as mensagens ofensivas, anônimas, que contenham termos de baixo calão, incitem à violência e aquelas cujos autores não possam ser contatados por terem fornecido e-mails falsos.