Amanhã vai fazer três semanas que o Estado ía publicar a entrevista com Francenildo dos Santos Costa, em que ele contestava, com pencas de detalhes, a versão do então ministro Antonio Palocci de que nunca pusera os pés da casa de má fama montada em Brasília pela sua patota de Ribeirão Preto.
Publicada no dia seguinte, terça-feira, 14 de março, sem as passagens que diziam respeito à vida pessoal de Palocci – salvo uma, que deve ter passado batido -, a entrevista desencadeou a mais aguda crise do governo Lula, com a decapitação, por enquanto, do ministro da Fazenda e do presidente da Caixa, Jorge Mattoso.
Hoje, em larga medida graças a inconfidências que podem tranquilamente ser atribuídas a Mattoso – o qual confessou na Polícia Federal ter ordenado o ‘acesso indevido’ à conta poupança de Francenildo na instituição – a imprensa praticamente fechou o círculo de revelações sobre a anatomia do crime.
Mattoso contou à Polícia Federal que Palocci o chamara para uma conversa no Palácio do Planalto, na tarde do dia 16, sobre as entradas e saídas na conta de Francenildo a partir de janeiro.
É certo como 2 e 2 são 4 que, publicada a entrevista, a Receita alertara o ministro para ‘movimentações inusitadas’ na conta do caseiro, facilmente verificáveis pelo exame dos descontos de CPMF no período. Não está claro se a iniciativa de prestar atenção nesses valores partiu do ministro ou da Receita.
Seja como for, Mattoso – só pode ter sido ele ou alguém falando por ele – contou a mais de um repórter, ‘em off’, que naquela conversa o ministro, seu superior hierárquico, ordenou-lhe que invadisse a conta de Francenildo.
Depois, quando a calamitosa idéia de vazar os dados para a revista Época teve o efeito de arrancar a mão de quem acabara de puxar o pino da granada, Palocci tentou tirar o seu do escândalo.
Mattoso – só pode ter sido ele ou alguém falando por ele – contou ao repórter Kennedy Alencar, ‘em off’, que, diante da sugestão do ministro de que ‘matasse no peito’, sozinho, o vexame, assumindo toda a responsabilidade pelos malfeitos cometidos, o já ex-titular da Caixa respondeu com um palavrão. Está na Folha de hoje.
Pois bem. Passados 19 dias da entrevista, enquanto uma montanha de indícios incisivos deixa vergonhosamente claro até onde Palocci, Mattoso e tutti quanti se permitiram ir para acabar com a raça do caseiro que esqueceu qual era o seu lugar – e passou de denunciante a investigado pela Polícia Federal – ainda não apareceu nem uma única, misera prova de que ele pediu e/ou recebeu dinheiro da oposição para difamar o ministro a quem o presidente Lula viria a chamar de ‘grande irmão’, na posse do seu sucessor.
Lula decerto não se deu conta do duplo sentido da expressão, no contexto dos atos praticados por Don Palocci. Mas, como todo mundo faz nessas horas, fingiu ser verdade que ele pedira o seu ‘afastamento’ para o bem do governo e do país. Provavelmente só o presidente deve saber quanto precisou pelejar para que o ministro pedisse o boné.
Para enxergar o caso do caseiro numa perspectiva mais abrangente do que a do varejo da política, por escabroso que seja, não perderá o seu tempo quem ler, no Globo de hoje, o artigo de Miriam Leitão, intitulado ‘Vingança do invisível’. Para abrir o apetite, começa com a história de um psicólogo que, para fazer uma tese, se fez passar por gari.
Está em http://oglobo.globo.com/jornal/colunas/miriam.asp
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