O leitor Marcos Aurélio Mendes de Souza escreveu:
‘Fiquei curioso sobre uma coisa, você diz que a simples perda de credibilidade é suficiente para um jornalista que inventa, aumenta ou distorce fatos? Gostaria de lembrar o caso dos donos de um escola em São Paulo (não me lembro os nomes) que tiveram suas vidas destruídas e quase foram linchados por culpa dos exageros da imprensa. Aproveitando, gostaria de perguntar sobre o caso do ministro do Superior Tribunal de Justiça Paulo Medina. Caso se confirmem as acusações ele, no máximo será forçado a se aposentar, haverá o constrangimento e a perda de credibilidade, mas haverá justiça?’
Eis a resposta:
Não digo que a perda de credibilidade seja suficiente para jornalistas que cometam desvios profissionais, nem para meios de comunicação. Em ambos os casos existe o caminho da punição judicial. Proporcional à ofensa, a critério dos juízes.
Se, por hipótese, um veículo for repetidamente acusado de distorcer os fatos, se sofrer seguidas punições, não acredito que mantenha sua posição de mercado por muito tempo.
Mas, atenção: para tanto, é preciso que o advérbio ‘repetidamente’ se aplique a um arco de tempo contínuo. É tal famosa história do esquecimento que a cada quinze anos acomete a sociedade brasileira.
Temos um exemplo de perda de terreno de um mau jornalismo, a cavaleiro entre as décadas de 1980 e 1990. Não se trata de fraudes ou crimes, mas, digamos, de ‘estilo’. O estilo ‘Aqui e Agora’, criado no SBT. Ele chegou a arrastar a Rede Globo para baixarias (e ela nunca mais saiu totalmente desse território, embora tenha recuado), mas nos últimos anos veio sendo derrotado. Restam, nos grandes centros, poucos programas desse tipo.
Ainda temos a Polícia Federal, sobretudo, como parte da equipe das emissoras de televisão. Acho que o ministro da Justiça deveria dizer à Polícia Federal que ela não é do elenco da Globo e das outras emissoras. Ou então cobrar pelos serviços prestados. Seria curioso fazer a minutagem da PF nos noticiários de horário nobre de todas as emissoras. Imagens, muitas vezes, fornecidas pela própria PF. Para as emissoras, é bom negócio: noticiário de polícia (mexe com violência, medo) – freqüentemente abre o Jornal Nacional, por exemplo, para segurar audiência – e baixo custo (bem mais barato do que colocar repórteres fazendo longas apurações pelo Brasil afora).
Voltando: o estilo ‘Aqui e Agora’ não sobreviveu nem no SBT. E as principais redes de televisão partiram para noticiários clonados do Jornal Nacional, em alguns casos com egressos da própria Globo (Ana Paula, Adriana, Nascimento). É uma vitória de um padrão menos ruim de jornalismo, creio.
O caso da Escola Base ocorreu não muito tempo depois do impeachment de Collor. A imprensa tinha conquistado uma posição de grande visibilidade e respeitabilidade, a despeito de barbeiragens e outras maluquices cometidas por diferentes meios de comunicação no próprio caso Collor.
A reação ao linchamento dos donos da escola, o esclarecimento dos fatos, veio aos poucos. Se os profissionais que cometeram as atrocidades na época não foram punidos, e eles não o foram, o caso nunca mais deixou de ser referência. (Os jornalistas foram induzidos por um delegado de Polícia em busca de notoriedade, como há tantos ainda no circuito; praticamente todo dia aparece algum falando algo como ‘todas as hipóteses serão examinadas’; e o mais incrível é que essas bobagens são repassadas para o público como se tivessem algum valor.)
Depois desse período pós-Collor temos o advento da internet, e mais recentemente da banda larga. Ampliou-se espetacularmente o espaço de crítica. É claro que os leitores antigos sem acesso a novas tecnologias continuarão apegados a seus jornais e revistas a despeito de toda crítica que se lhes faça (aos meios), mas, se eles são uma solução a curto prazo, não são solução a longo prazo, porque vão envelhecer e morrer. O novo leitor é bem mais atento e ‘plugado’ (isso também significa que as injustiças são cometidas com a velocidade do raio…).
Quanto ao juiz Medina, temos dois momentos previsíveis: um é o afastamento do Tribunal, aposentadoria, etc. O outro é o processo criminal a que, se as denúncias forem acolhidas, ele será submetido. O juiz Nestor do Nascimento passou longos anos preso (não sei se ainda está preso, ou vivo). E o juiz Rocha Mattos, alvo da Operação Anaconda, está preso há anos. O notório Nicolau dos Santos Neto não era juiz de carreira. Está em prisão domiciliar.