A números em geral e aos números de pesquisas em especial aplica-se o famoso dito do chanceler prussiano Otto von Bismarck sobre as baionetas: ‘Pode-se fazer tudo com elas, menos sentar em cima.’
A mídia, principalmente quando ela própria tem um braço pesquiseiro, como é o caso da Folha de S.Paulo, corre o risco de se ferir diante do leitor quando se aboleta sobre os dados das preferências eleitorais que publica periodicamente.
Ou seja, divulga a numeralha, com tabelas, gráficos e tudo mais, e não oferece ao leitor explicações – no plural, de preferência – sobre as suas causas prováveis.
Para ajudar a entender pelo menos os seus aspectos mais inusitados.
Hoje, debulhando pela terceira edição consecutiva os resultados de seu novo levantamento sobre as tendências de voto em outubro, a Folha noticia mal e explica pior, por omissão, a mais espetacular mudança ocorrida em São Paulo da pesqisa anterior, de 17 de março, para esta, de 7 de abril.
Noticia mal porque dá em manchete na página A 9 que ‘Vantagem de Alckmin em SP cai 10 pontos’. É verdade. Mas não a verdade mais importante.
Essa está nas tabelas que desdobram os dados por área de residência dos entrevistados – capital, região metropolitana e interior.
Na capital, nada mudou: Alckmin perdeu 2 pontos, Lula, 1. Na Grande São Paulo, as mudanças tampouco são significativas: Alckmin perdeu 4 pontos, Lula 3.
Mas no interior, onde vive a maioria dos 27,7 milhões de eleitores paulistas, as coisas mudaram – e como!
Em apenas três semanas, Alckmin caiu de 50% para 41% e Lula subiu de 27% para 36%. Com isso, a diferença entre eles encolheu de 23 pontos para 5. Um terremoto. Chose de loque, diria o Jô Soares.
Correndo os olhos pela matéria para saber o que pode estar por trás dessa guinada cavalar, o leitor topará com o que diz o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino:
‘A pesquisa captou melhor os reflexos das denúncias em relação a Alckmin, que, aparentemente, foram mais acentuados no Estado de S.Paulo.’
É uma análise que compara São Paulo com o conjunto do país. Não contém uma mísera pista para se entender por que, para usar as palavras de Paulino, os reflexos foram mais acentuados – e ponha-se acentuados nisso – não na capital, nem na região metropolitana, cujas populações seriam supostamente mais bem informadas do que as outras, mas no interior.
Justamente no interior, onde o então governador nadava de braçada em matéria de popularidade. Um mistério.
Que tal a Folha levantar o traseiro [como diria o presidente Lula] dos números e tentar identificar os fatos que eles traduzem?
***
Os comentários serão selecionados para publicação. Serão desconsideradas as mensagens ofensivas, anônimas, que contenham termos de baixo calão, incitem à violência e aquelas cujos autores não possam ser contatados por terem fornecido e-mails falsos.