O título da reportagem do último domingo na Folha de S.Paulo, p A-6, não deixa margem para dúvidas: ‘Circulação de jornais aumentou 3,9% no ano passado, diz IVC’. A afirmação dá a entender que efetivamente houve um aumento na tiragem dos jornais brasileiros, mas, ao se ler a matéria, vê-se que o tom triunfalista não procede – muito pelo contrário, como, aliás, mostram os números e os gráficos que acompanham o texto.
A meia-verdade – ou meia-mentira, pode-se escolher – dá as caras no título e dribla o leitor do começo ao fim. Não há qualquer cifra indicando crescimento entre os maiores jornais do país, com exceção do O Globo, mas sim estagnação.
Aos números:
Em 2000, a Folha de S.Paulo tirava, em média, 440,7 mil exemplares por dia; em 2001, escorregou para 399,7 mil; em 2002, caiu para 346,6 mil; em 2003, encolheu para 314,9 mil; em 2004 diminuiu para 307,7 mil e, em 2005, cresceu 307,9 – ou seja, 200 exemplares a mais do que no ano anterior.
O Estado de S.Paulo também desceu a ladeira: 399 mil exemplares em 2000; 341,3 mil em 2001; 268,4 mil em 2002; 253,4 mil em 2003, 233,5 mil em 2004 e 230,9 mil no ano passado. O que os números mostram é a queda contínua desde 2000. No período, o jornal perdeu 168,1 mil exemplares – ou 33,62 mil por ano, 2,80 mil por mês.
O Globo tem o melhor desempenho, entre os jornais mais influentes do país: caiu de 322, 5 mil em 2000 para 296,3 em 2001, e tornou a encolher, em 2002, para 266,2 mil. No ano seguinte, afundou um pouco mais, para 253,4 mil e, desde então mantém-se em ascensão: 257,5 mil em 2004 e 274,9 mil no ano passado.
O Zero Hora, de Porto Alegre, ocupa o posto que, um dia, pertenceu ao Jornal do Brasil, que fechou o ano passado com melancólicos 68,2 mil exemplares diários, quantia ainda menor do que sua recente irmã, a Gazeta Mercantil, que fechou o ano de 2005 com 74,5 mil. O Zero Hora também perdeu eleitores entre os anos 2000 e 2001 – 182,mil exemplares, contra 167,9 mil -, recuperou-se nos três anos seguintes, alcançando a média diária, em 2004, de 180,4 mil, mas voltou a retrair-se em 2005, fechando o ano com média diária de 178,2 mil exemplares.
A reportagem também traz números de três jornais ‘populares’ – Agora, Diário de S.Paulo e Jornal da Tarde – mas o quadro é igualmente desalentador. Dos três, apenas o Agora esboçou alguma reação nos dois últimos anos, com 80,6 mil exemplares em 2005, apenas 400 a mais do que no ano anterior.
‘Os números auditados pelo IVC confirmam que a maior expansão ocorreu entre os jornais populares, cuja circulação total cresceu 7% no ano passado: 1,158 milhão de exemplares contra 1,082 milhão em 2004. A circulação dos jornais regionais cresceu 1,4%’, completa o texto.
Dois diretores da Associação Nacional dos Jornais comparecem no texto. Fernando Martins, diretor-executivo, comparece na reportagem. Primeiro, ele afirma que.’desde meados do ano passado, já se percebia um aumento consistente da circulação de jornais no país’. O ‘crescimento’ visto pelo diretor da associação, ele próprio adverte não se deveu à entrada da crise política nas manchetes, mas sim a outras medidas que aprimoraram os departamentos de vendas e assinaturas. ‘As empresas se preocuparam muito com a qualidade da prestação dos serviços aos assinantes. Isso, de certa maneira, também alavanca as vendas’, acredita ele.
Mais adiante, ele escorrega dizendo que 2006 está sendo esperado com otimismo pelas casas editoriais porque o ano é de Copa do Mundo e eleições. ‘A Copa do Mundo sempre dá um alento às vendas de jornais. A agenda eleitoral também deverá ter reflexos na circulação, com novos leitores interessados na campanha e nos programas políticos’, garantiu. Os números de 2002, também de Copa e de eleição, entretanto, mostram exatamente o inverso.