Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Por onde começar no jornalismo quando faltam empregos seguros

Qualquer conversa com um candidato ou estudante de um curso de jornalismo inevitavelmente passa pela pergunta: Por onde eu começo na profissão? São raros os que têm resposta para esta dúvida que na verdade é um desafio, inclusive para muitos profissionais que enfrentam a dura realidade do desemprego.

Na verdade não existe uma receita segura a ser seguida. É impossível tê-la na conjuntura atual onde tudo está mudando e o jornalismo passa pela sua maior transformação desde que Gutenberg inventou a impressão gráfica, há cinco séculos. Mas apesar da incerteza generalizada, uma observação das experiências de jornalismo online permite algumas constatações que podem amenizar a angústia de quem ainda não sabe o que fazer com o diploma ou precisa achar um novo sustento.

Quase todos os pesquisadores do jornalismo na internet, como o norte-americano Jay Rosen, coincidem que a busca de um nicho informativo é o destino inevitável da maioria dos recém-graduados em faculdades de jornalismo. Para os profissionais desempregados ou desiludidos com a imprensa convencional, a opção pela especialização noticiosa já é uma realidade. Não há mais possibilidade de sair da universidade e entrar imediatamente numa empresa jornalística de grande ou médio porte. O número de vagas oferecidas anualmente na imprensa é muito menor do que o de graduados em jornalismo no mesmo período, aqui ou no resto do mundo.

A variedade de nichos informativos é praticamente ilimitada, especialmente agora na era da internet, onde é possível encontrar informações sobre quase tudo o que se possa imaginar. Nos Estados Unidos ficou famoso o caso de um morador de uma microcidade no interior do estado de Alabama, obcecado por músicas de Frank Sinatra da década de 1940. Ele juntou todos os long plays possíveis de seu ídolo como hobby, e começou a ganhar dez mil dólares mensais a partir de 2010 vendendo versões digitais pela internet.

O segredo do fã de Sinatra foi seu esforço para reunir material e vendê-lo para um mercado planetário. Na sua cidade, ele talvez encontrasse um comprador. No Alabama possivelmente uns 50. Nos Estados Unidos, uns dois mil interessados por mês. Mas no mundo inteiro, ele acabou sendo descoberto por quase 10 mil clientes mensais, um mercado que ele nunca imaginou alcançar e que passou a lhe garantir o sustento. Isso tudo a partir de um vilarejo com não mais de cinco mil habitantes.

A estratégia do nicho se apoia em três bases: coletar informação (em texto, áudio ou imagens), digitalizar num computador e vender pela internet. As despesas iniciais são muito pequenas se comparadas às da abertura de um negócio convencional na área da informação. O principal investimento é em tempo e dedicação. Tempo para pesquisar o tema, o público-alvo e a forma de divulgar a iniciativa. Dedicação para suportar a falta de resultados imediatos.

Em princípio, qualquer tema pode se transformar em nicho jornalístico. O conceito de notícia não se restringe hoje apenas ao que está na agenda da imprensa, ou seja, política, esporte, economia e internacionais. A avalancha informativa da internet permitiu que o noticiário local e hiperlocal ganhasse visibilidade e interesse por parte das pessoas já saturadas com a mesmice do noticiário convencional.

Pessoas sem formação jornalística começaram a explorar, por simples gosto pela informação, nichos como, por exemplo, monitorar a variação de preços num mesmo supermercado, guardando as notas fiscais de suas compras domésticas semanais. Depois de alguns meses, os dados acumulados foram cruzados com os de outras pessoas que desenvolveram atividade idêntica noutros estabelecimentos, surgindo daí um banco de dados cujo conteúdo passou a ser disputado por jornais por ser uma expressão direta da experiência do consumidor com a inflação.

Os profissionais do jornalismo ainda vacilam em optar pela atividade autônoma em nichos noticiosos porque ainda estão muito contagiados pelas rotinas das redações convencionais. Mas já existem experiências muito bem sucedidas como O TREM Itabirano, em Minas Gerais, a Voz de Rio das Pedras, no Rio de Janeiro, ou o Jornal Pessoal, de Belém do Pará. Na Grécia, a rádio Bubble, e na Espanha, o jornal online El Diario são projetos desenvolvidos por jornalistas profissionais demitidos em consequência da crise econômica na imprensa convencional.

condição obrigatória para o trabalho em nichos de informação é gostar muito, mas muito mesmo, do tema ou foco escolhido, porque os resultados financeiros demoram a surgir e, no período das vacas magras, só a paixão profissional manterá o projeto de pé. A maioria dos que optaram por iniciativas pessoais tiveram, ou têm, uma fonte paralela de renda porque a insegurança faz parte do negócio. O enorme afluxo de novos exploradores digitais muda constantemente o ambiente informativo com o surgimento sucessivo de novos nichos. A rotatividade de negócios na internet é muito grande.

O nicho informativo jornalístico é parte da teoria econômica chamada Cauda Longa (Long Tail), segundo a qual a internet viabilizou a venda de um grande número de produtos em pequenas quantidades, contrariando a técnica usual na produção industrial de vender poucos produtos muito populares em grandes quantidades. A opção pelo nicho não é fácil, mas é a mais viável num contexto de mudanças constantes no ambiente jornalístico. Ela é também o primeiro passo para a formação de futuras redes jornalísticas noticiosas, um desdobramento dos nichos já com uma base financeira e tecnológica muito mais sólida e estável.