Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Por que o horário eleitoral gratuito é tão chato?

A resposta é simples: porque os indivíduos que aparecem na TV e no rádio estão prioritariamente preocupados com seus objetivos pessoais, ou do partido onde estão hospedados. Assim, o eleitor não tem o menor interesse em deixar o que está fazendo para ouvir uma sequência monótona de promessas e currículos pessoais. E nessas condições, o horário eleitoral não cumpre, nem de longe, a sua missão teórica de preparar as pessoas para votar.

Na verdade, o espaço gratuito para propaganda política virou um teatro e uma arena. Teatro porque por ele desfilam personagens que tentam atrair a atenção dos poucos espectadores e ouvintes mais pelo histrionismo do que pelas propostas. Arena porque os candidatos disputam segundos de visibilidade como uma questão de vida ou morte, onde a preocupação com a concorrência dos demais candidatos pesa mais do que a com o interesse do público.

Pesquisas acadêmicas mostraram que as pessoas procuram notícias que lhes permitam produzir mais, consumir melhor e ter mais opções de prazer. Estes são os três elementos mais importantes no poder de atração de uma notícia, do ponto de vista dos leitores e audiências. A política não se encontra entre essas prioridades, o que é um grande paradoxo, porque é por meio dela que são tomadas decisões que afetam a vida das pessoas.

A política só ingressa na agenda de interesses do público quando é associada a escândalos, violência, ou quando ganha, durante processos eleitorais, características que a assemelham a uma corrida de cavalos. Quando isso não acontece é muito pouco provável que um indivíduo decida ir a uma sessão da Câmara Municipal, Assembleia Legislativa ou da Câmara de Deputados para ver o que está sendo discutido e votado. Só vai, em grupo, para fazer lobby por alguma questão corporativa.

A política, como prática social, é algo complexo – o que a coloca de imediato fora das preocupações da imprensa cuja sobrevivência financeira depende da publicação de notícias de consumo fácil para servirem de chamariz para a publicidade. O debate de questões como política salarial envolve uma diversidade enorme de dados, conhecimentos, contextos, interesses e procedimentos. 

A imprensa deveria traduzir toda essa gama de fatores num formato comunicativo compreensível por diferentes segmentos da população, procurando alimentar debates em grupos sociais para que estes possam participar melhor na solução de seus desejos e necessidades. Mas como a política é um item noticioso de vendagem difícil para os anunciantes, o resultado é um arremedo de cobertura que cumpre uma função burocrática formal, mas profundamente entediante para o eleitor.

Como a maioria dos candidatos usa a política para manter ou conquistar empregos e poder, enquanto a imprensa sabe que a mistura de negócios e eleições sempre acaba atropelando a ética, fica fácil perceber como o eleitor se transformou num personagem descartável na propaganda eleitoral pelo rádio e televisão.

Os políticos só mudam de comportamento sob pressão porque isto ameaça seus empregos. Quem pode alavancar esta pressão é a imprensa, se ela resolver apostar em quem realmente garante a sua sobrevivência, o leitor. Os jornais e a televisão começaram a alimentar esse processo com as denúncias de corrupção e mau uso do poder pelos políticos. Mas a estratégia ainda não conseguiu provar que seu objetivo é a mudança da cultura política e não um instrumento para que partidos e políticos promovam retaliações recíprocas.

Enquanto a imprensa não vestir a camiseta do esforço para mudar a cultura política por meio de um processo longo e inevitavelmente complexo, ela ficará na incômoda posição de ter que aguentar um horário eleitoral gratuito que afugenta o público, e ao mesmo tempo contribuir para a chatice da propaganda ao tornar-se cúmplice de um sistema que aumenta a tentação do voto em branco, nulo e abstenção