Quem trabalha ou já trabalhou numa redação jornalística, seja ela em jornal, rádio, TV e até na internet, sabe que mudar procedimentos e rotinas é uma coisa difícil de ser feita, principalmente quando tudo parece estar funcionando bem.
Isso acontece porque o exercício do jornalismo se transformou numa linha de montagem de notícias, onde o principal objetivo é produzir a baixo custo, com a menor margem de erro possível e com a maior automatização possível. Parece a receita ideal para uma fábrica de geladeiras, mas é o que acontece nas redações de grandes empresas jornalísticas.
A incorporação do método industrial na produção de notícias trouxe vantagens financeiras para os donos do negócio, mas teve como efeito colateral a criação de um sistema em que a preocupação com a minimização do erro e com a economia acabou anulando a capacidade inovadora numa atividade onde mudar faz parte do DNA.
A linha de montagem foi criada por Henry Ford em 1914, entre outras coisas para reduzir a incidência de erro entre os operários de sua fábrica de automóveis. O medo do erro ainda é um dos fatores determinantes da resistência à mudança, porque toda inovação implica risco, o que numa redação significa a possibilidade de contrariar egos e regras. O preço pode ser desde o ostracismo até a demissão.
O temor dessas consequências alterou o comportamento dos profissionais nas redações das grandes empresas jornalísticas e tornou-se a justificativa oculta para a resistência à mudança e à experimentação. Serviu também para embasar um ceticismo crônico e domar a rebeldia criativa dos mais jovens. Este fenômeno contagiou desde o estagiário da redação até o redator chefe.
O resultado foi a rotinização de uma atividade estruturalmente ligada a produzir representações da realidade na forma de notícias, reportagens e documentários. Cada representação é diferente e específica porque resulta da percepção do repórter de texto, de som ou de imagem. Se há uma coisa que muda a cada instante, esta é a realidade que nos cerca e o contexto em que atua o jornalista.
A grande questão é que os executivos da indústria jornalística só decidem mudar e inovar quando as fórmulas vigentes deixam de produzir os resultados esperados, gerando impasses operacionais e crises gerenciais. Aí a mudança ocorre sob pressão e sob cobrança de resultados rápidos e positivos, condições que geralmente conduzem a novas frustrações e à intensificação de conflitos.
O advento da era digital e de suas consequências já era do conhecimento da indústria jornalística desde os anos 1980, justamente a época do auge da lucratividade dos jornais na Europa e nos Estados Unidos. As novas tecnologias digitais eram notícia constante nos jornais, que tinham mais condições do que qualquer outro setor empresarial para acelerar mudanças em seu modelo de negócios e antecipar-se às transformações no contexto informativo mundial.
Mas a rotina e a equivocada teoria de que “não se mexe em time que está ganhando” impediram os executivos de empresas jornalísticas de assumir decisões gerenciais inovadoras num contexto em que o mais lógico seria aproveitar a era de vacas gordas até o ultimo momento. E deu no que deu. Crise no jornalismo norte-americano e perplexidade generalizada entre os profissionais.
Agora, todos buscam freneticamente inovações capazes de salvar a indústria dos jornais e recuperar minimamente os níveis de empregabilidade, mas o ceticismo mudou de lado. É difícil acreditar no sucesso de mudanças sob pressão, porque esse procedimento contraria a própria natureza do processo da inovação, que precisa ser livre e levar em conta a complexidade do contexto informativo. O discurso da mudança está na boca de todos os executivos, mas são muito poucos os que têm coragem de enfrentar as incertezas da quebra de paradigmas.
Aos leitores: Passei algum tempo sem postar porque mudei de moradia e, como diz o editor do site do OI, Luiz Egypto, uma mudança equivale a dois incêndios. O importante é que sobrevivi.