O domingo amorteceu, mas só até hoje, o impacto da cobertura da Folha da reunião a portas fechadas do Diretório Nacional do PT, em São Paulo, no dia anterior.
Nenhum jornal, afinal de contas, conseguiu apurar junto a participantes do encontro que reuniu 70 petistas estrelados o que ali disse o secretário do partido, Silvio Pereira.
Os repórteres Catia Seabra, Laura Capriglione e Fábio Zanini apuraram – e até agora não foram desmentidos — que Sílvio Pereira afirmou que, se Roberto Jefferson acusou cinco petistas no depoimento ao Conselho de Ética da Câmara, “por que só dois” (ele e o tesoureiro Delúbio Soares) deveriam ser punidos com o afastamento dos cargos que exercem.
E, ainda segundo a Folha, disse duas frases explosivas. Uma: “Agimos em nome do PT”. Outra: “O que eu fiz foi decisão partidária”.
Pena que, desde então, nenhum órgão de mídia tenha procurado, ou conseguido perguntar ao secretário petista (ou ao presidente José Genoíno) o que foi mesmo que ele fez por decisão partidária. Pagar mesada a políticos da base aliada na Câmara? Prometer a Jefferson, em coro com Genoíno, R$ 20 milhões sem recibo para as campanhas municipais do PTB ano passado?
Enquanto isso não ficar esclarecido, as quatro palavras de Sílvio Pereira que a oposição já juntou ao seu patrimônio – “o que eu fiz” – são mais perturbadoras do que todas quantas Jefferson pronunciou nas suas duas longas entrevistas à mesma Folha.
”Apunhalado pelas costas”
Na mesma sexta-feira em que deu a história capenga de que no ano passado o PT paulistano ofereceu R$ 4 milhões ao PPS para que apoiasse a prefeita Marta Suplicy (ver “Jornalismo em tempo de cólera”, 18/6), o Estadão também foi em cima do senador neopetista Delcídio Amaral, presidente da CPI dos Correios e ex-diretor de Gás e Energia da Petrobrás, no governo Fernando Henrique.
O jornal disse ter obtido um parecer encomendado pela estatal ao jurista Eros Grau, antes de ele entrar para o Supremo, segundo o qual Delcídio proporcionou “enriquecimento sem causa” a duas empresas parceiras da Petrobrás, Enron e El Paso.
Elas tinham sido beneficiadas em seus contratos com uma cláusula que garantia rentabilidade mínima a duas termelétricas suas (Eletrobolt e Macaé Merchant), mesmo que não gerassem energia.
Foi o que aconteceu porque, mesmo não precisando delas para diminuir os efeitos do apagão, a Petrobrás pagou-lhes pelo menos R$ 2 bilhões a título de “contribuição de contingência” para garantir os custos e a remuneração do capital empatado.
“Envolvido com as reuniões da CPI, o senador Delcídio não retornou as ligações do Estado”, escreveu o jornal no pé da matéria – e aparentemente não voltou a procurá-lo no preparo da suite “Delcídio pede a Lula que demite quem o denunciou”, publicada sábado. O denunciante seria o atual ocupante do cargo que ele ocupara, o professor Ildo Sauer, da USP.
Delcídio foi notícia nesse dia por dizer que “o maior adversário do PT não é a oposição, somos nós mesmos, alguns companheiros que querem colocar nas manchetes homens dignos”.
No domingo, esse foi o mote do título de um artigo de Delcídio na página de Opinião do Globo, ao qual ele se referiu como “um jornal com respeitabilidade”, presumivelmente para contrastar com o Estado, onde teria sido “apunhalado pelas costas, atingido por uma reportagem de algo de página, com chamada na primeira página…”.
”Quinta roda do carro”
Ele escreveu o artigo mais para pedir em letra de forma ao presidente Lula que mande demitir o diretor que teria “planatado” a acusação contra ele do que para qualquer outra coisa. Considerou o mérito da questão – o prejuízo da Petrobrás – “assunto velho, já explicado, pisado, repisado, batido e rebatido”.
Dulcídio não nega o prejuízo, mas diz querer lembrar, “pela enésima vez, que os contratos das usinas estabeleciam a sua rediscussão, a qualquer momento, inclusive por arbitragem” – o que não teria sido pela “diretoria responsável”.
Vamos separar os problemas. Um é a queda de braço entre Dulcídio e Ildo. Outro é saber se a matéria do Estado acrescentou algum dado novo ao que o senador chama “assunto velho”.
Aparentemente, não, mesmo que nunca antes tenha chegado a conhecimento público o parecer encomendado pela Petrobrás ao doutor Eros Grau. De resto, a reportagem cheira ao que os gringos chamam “hatchet job” (ato de abater alguém a machadadas).
Tanto que o prato de resistência da matéria, ocupando 6 dos seus 8 parágrafos, é a sua ampliada influência na Petrobrás, onde “emplacou vários nomes” (devidamente identificados), “respaldado pelo então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu”.
No momento em que o senador assume a presidência da CPI que o PT fez tudo para sufocar ainda no berço, faz sentido um texto que trate das suas relações com o até bem pouco homem forte do Planalto. Mas a questão dos pagamentos feitos às empresas do setor elétrico entra aqui como a quinta roda de um carro.