A guerra entre o presidente Hugo Chávez e os jornais de oposição está atingindo um novo patamar de radicalização e provocando ondas de choque que já começam a contaminar outros países latino-americanos onde governo e imprensa também andam às turras.
Esta velha briga entre governos populistas e a oligarquia midiática ganhou agora um novo componente que precisa ser contextualizado para evitar o risco de acabarmos envolvidos num bate-boca estéril entre supostos defensores da liberdade de expressão e autoproclamados paladinos da mudança social.
A queda de braço entre Chávez e os donos de jornais de oposição é na verdade uma luta pelo poder disfarçada de batalha pela liberdade de expressão. Tanto um lado quanto o outro têm seus interesses em jogo e, como já é praxe, quando a temperatura sobe na guerra de palavras, a primeira vítima é sempre a objetividade jornalística.
As grandes corporações da mídia venezuelana estão longe de ser modelos de produção jornalística. Ao longo de toda a história do país, a exemplo de vários outros vizinhos latino-americanos, a imprensa sempre foi um negócio controlado por famílias e usado como arma política e comercial.
Venezuela é um caso extremo neste contexto, porque foram raras as conjunturas históricas em que os venezuelanos puderam usufruir de uma imprensa preocupada prioritariamente com a objetividade e diversidade informativa.
O novo entrevero entre os jornais conservadores e o presidente Chávez vem a propósito de uma medida legal estabelecendo limites para a crítica ao governo e instituições públicas. A situação ficou ainda mais confusa em decorrência de ameaças de prisão e intimidações a jornalistas, inclusive alguns reconhecidamente independentes.
O objetivo do governo Chávez é claro: neutralizar a oposição política por meio de um maior controle sobre o que é publicado na imprensa. A resposta dos jornais oposicionistas foi subir o tom das críticas ao presidente tornando as notícias ainda mais polarizadas politicamente.
A publicação de notícias e dados oriundos de várias fontes não é um luxo informativo, mas uma exigência da economia digital. Sem a diversidade informativa é impossível obter os dados necessários para alimentar o processo de inovação que é fundamental para o desenvolvimento econômico contemporâneo.
A diversidade informativa, que está na base do direito da livre informação, é uma condição sine qua non para o exercício do jornalismo, seja por profissionais ou por amadores, porque ela está diretamente vinculada às necessidades do público.
O problema é que esta questão hoje está escondida no cipoal de acusações mútuas entre governo e jornais oposicionistas na Venezuela. A polarização política está empurrando todo mundo para posições dicotômicas, tipo bom/mau, progressista/reacionário , que dificultam a contextualização na medida em que tendem a eliminar situações intermediárias.
E a polarização conduz inevitavelmente a soluções do tipo tudo ou nada, repetindo o que aconteceu às vésperas dos golpes de Estado nos anos 1960 e 70 no Brasil, Argentina, Chile, Uruguai, Bolívia e Peru.
O grande problema da imprensa venezuelana é que ela está de tal maneira desgastada pela politização do noticiário anti-Chavez, que vai ser muito difícil recuperar a confiança do público, mesmo que ela ganhe a disputa com o governo. O risco é o país ficar ingovernável e, além disso, sem jornais, rádios e televisões capazes de preencher o vácuo de credibilidade deixado pela polarização ideológica.
Outra conseqüência perigosa da radicalização venezuelana é a regionalização do conflito na medida em que empresários da comunicação de outros países como Equador e Bolívia já dão sinais de que pretendem subir o tom das criticas aos respectivos governos alegando que eles pretendem imitar Hugo Chávez.