As redações de jornais norte-americanos já não estão mais preocupadas com a nova onda de demissões, mas sim com o que poderá ser feito pelos profissionais que conseguirem manter o emprego.
Desde meados de outubro mais 3.500 jornalistas e profissionais de quatro grandes jornais e revistas dos Estados Unidos perderam seus empregos numa crise que já se arrasta há pelo menos dois anos — e que ninguém ousa arriscar quando chegará ao fim.
O centenário Christian Science Monitor, de Boston, que já foi um dos jornais referência no país, anunciou melancolicamente que suspenderá a sua edição diária e passará a publicar apenas uma revista semanal de noticias. Cerca de 150 profissionais terão que procurar outro emprego.
A cadeia Gannett, uma das três maiores redes de jornais dos Estados Unidos, anunciou cortes de 10% de seu staff, o que equivale a mais ou menos 3.000 funcionários administrativos e jornalistas. É a maior redução de empregos de uma só vez em toda a história da imprensa norte-americana.
A revista Time, outro ícone do jornalismo mundial, vai mandar para casa 600 empregados e o jornal Star-Ledger, da cidade de Newark, o décimo-quinto maior jornal dos Estados Unidos, cortou 40% de sua folha salarial para não fechar de vez. O Los Angeles Times demitiu 75 jornalistas e optou por ficar com apenas um crítico de filmes, um fato paradoxal já que está sediado na capital mundial do cinema.
Para completar, a revista TV Guide, que revolucionou o segmento de publicações especializadas em televisão, foi vendida na segunda semana de outubro por 1 dólar, menos que o preço de um exemplar (US$ 2,99). A revista que chegou a ter tiragens de até 30 milhões de exemplares vinha acumulando prejuízos mensais de 1,5 milhão de dólares. Sua dívida foi estimada em 150 milhões de dólares.
O horror econômico não assusta mais a elite do jornalismo norte-americano, segundo admitiu Gary Graham, editor da revista Spokane Spokesman-Review, que num recente fórum no National Press Club alertou: “Nosso grande dilema agora é saber que tipo de jornalismo será possível fazer com redações mutiladas, profissionais acuados e editores à beira de um ataque de nervos”.
Graham aposta na volta da cobertura local como tábua de salvação dos jornais, mas David Carr, do The New York Times, vai numa direção diferente. Para ele, a imprensa não tem problema de leitores, mas sim de consumidores. Segundo Carr, “há mais gente do que nunca procurando notícias e informações, o problema é que essas pessoas deixaram de ser consumidores fiéis, pois encontram o querem em muitos lugares diferentes, principalmente na web”.
Muitos jornais regionais dos Estados Unidos já enveredaram pelo caminho do Christian Science Monitor, desacelerando as versões impressas em beneficio da edição online. Mas a grande questão, segundo o professor Mark Hamilton, da Universidade de Calgary, Canadá, é que ‘não basta trocar um canal por outro, porque o problema real é o tipo de produto jornalístico que é oferecido ao publico”.
No meio da crise começam a surgir algumas iniciativas inusitadas, como a decisão dos jornais Washington Post e New York Times de criar um grupo de trabalho misto para estudar experiências de convergência de mídias em ambiente digital. Os dois jornais sempre se olharam com desconfiança, mas resolveram colocar velhas rixas de lado para buscar, juntos, saídas para a crise.
No Brasil, nossa imprensa continua proclamando que vive num mar de rosas e que tudo vai de vento em popa. É quase impossível checar se este otimismo tem fundamento ou não, dada a pouca transparência das contas dos grandes grupos da mídia nacional. Mas admitindo que a situação aqui seja bem diferente da existente nos Estados Unidos, isto já configura uma oportunidade única para rever o modelo de negócios da imprensa brasileira. Antes que seja tarde demais.