O Estado de S.Paulo, que tinha entrado com o pé esquerdo na história da carteirada do comandante do Exército em Viracopos – por ter omitido quem revelou em primeira mão o vexame – deu hoje a volta por cima na cobertura do caso, com distinção e louvor.
Quando o assunto parece ter saído do radar do Globo e da Folha – nada a respeito nas edições de hoje – eis que o repórter Gabriel Manzano Filho, do Estado, noticia que a versão do general Francisco Albuquerque sobre a modalidade de golpe do ‘sabe com quem está falando’ que aplicou no aeroporto tem mais furos do que um queijo suiço.
O jornalista capturou um relatório da Infraero sobre o espisódio. O relatório informa que, diferentemente do que afirmara, o general pressionou pessoalmente um militar do DAC para poder embarcar no lotado vôo da TAM para Brasília na Quarta-Feira de Cinzas.
Não apenas o vôo estava lotado quando o general chegou para embarcar, cerca de 20 minutos antes da partida, quando o embarque já tinha terminado e as portas do avião já estavam fechadas, mas havia 14 passageiros prejudicados pelo overbooking na frente do casal Allbuquerque.
Sempre que um jornalista vai aos fatos para checar as falas dos poderosos – e demonstra que elas não batem com aqueles – é como se a profissão renascesse.
A matéria de Manzano:
Um relato da Infraero sobre o modo como o comandante do Exército, general Francisco Albuquerque, conseguiu lugar em um avião da TAM, em Viracopos, na Quarta-feira de Cinzas, diverge inteiramente de sua versão e informa que um suboficial do Departamento de Aviação Civil (DAC) ‘recebeu determinação’ do militar de que ‘deveria estar a bordo, pois tinha compromissos inadiáveis em Brasília.’ O general tem sustentado que um auxiliar já havia feito seu check-in para o vôo, que a bagagem já estava despachada e que ele não se valeu do cargo para obter tratamento especial.
Esse informe – que é habitualmente preparado pelo supervisor da Infraero cada vez que termina seu plantão de 8 horas – foi anexado a uma sindicância que está sendo realizada pelo Comando Aéreo (Comar) de São Paulo e que deverá estar pronta na semana que vem.
Segundo ele, o general não fez check-in – apenas confirmou seu vôo, por telefone, de manhã – e não teve nenhuma bagagem embarcada antes por algum auxiliar. Por fim, não confirma sua alegação de que não fez pressão para conseguir os lugares para ele e para sua mulher, Maria Antonina.
O relato, do próprio dia, informa que o general ‘apresentou-se para o check-in no vôo JJ-3874, juntamente com sua esposa, sendo a reserva efetivada no dia 16 de fevereiro e confirmada na manhã de hoje, com os assentos 13B e 13C’. Quando se iniciava o despacho das bagagens, ‘o processo foi interrompido pelo sr. Alejandro Viniegra Figueiroa, recepcionista da TAM.’ Como havia overbooking (excesso de passageiros), este avisou que ‘não embarcaria a autoridade e sua esposa.’ Mas ‘(foi) acionado imediatamente o fiscal do DAC (Departamento de Aviação Civil), suboficial Agostini, que recebeu determinação do general Albuquerque, de que deveria estar a bordo, pois tinha compromissos inadiáveis em Brasília.’ Depois desse contato, ‘Agostini ligou para a torre, com o objetivo de impedir a saída da aeronave PT-MZQ’. Nesse momento, o aparelho ‘já havia iniciado o push-back’, mas ‘retornou para a marca R-17’ (o ponto de onde começou a taxiar). O informe menciona depois as negociações com dois passageiros, Erasmo Pinto Jr. e Sandra Oliveira, que ‘cederam seus assentos com a finalidade de embarcar a autoridade e sua esposa’.
O suboficial Agostini não quis comentar seu encontro com o general. ‘Estamos aguardando uma nota do Serviço de Comunicação da Aeronáutica (SecomSAer), que dará todas as explicações’, afirmou ele ontem, em Viracopos. Essa nota, provavelmente, se baseará nos resultados da sindicância do Comar e só será divulgada quando o comandante Albuquerque voltar do Chile.
Na TAM, o funcionário Alejandro Figueiroa também se calou. ‘Só a empresa, em São Paulo, pode falar desse assunto’, defendeu-se. No momento em que o general chegou ao balcão da TAM, por volta de 17h10, o vôo (que sairia às 17h30) não só estava lotado e os portões do avião fechados, como havia outras 14 pessoas na fila – o comandante e sua mulher, Maria Antonina, seriam os de números 15 e 16.
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