A reportagem da revista Veja desta semana, sobre as atividades ‘não contabilizadas’ do publicitário Duda Mendonça abre uma bifurcação na divulgação dos escândalos que se escondem atrás das campanhas eleitorais. Mais do que isso: os caminhos abertos para exploração do jornalismo investigativo colocam também em xeque a autonomia de diretores de redação. Duas cascas de banana foram deixadas para questionar a independência e a credibilidade dos veículos.
A primeiro dessas cascas esconde-se atrás de uma foto aparentemente inofensiva da reportagem ‘Marketing bandido’, na qual Duda Mendonça aparece entre outras duas pessoas: o ex-prefeito de São Paulo, Paulo Maluf, e uma terceira pessoa que a revista decerto se esqueceu de identificar. Trata-se de Nelson Biondi, sócio de Duda Mendonça durante os anos em que o ex-prefeito de São Paulo era o principal cliente da dupla. Nas eleições presidenciais de 2002, a dupla se desfez: Duda Mendonça bandeou-se para o PT e Nelson Biondi tornou-se o principal marqueteiro do candidato do PSDB, José Serra.
Biondi viveu anos seguidos de prosperidade ao lado do sócio do publicitário bandido, adjetivo que a revista aplica em Duda Mendonça inúmeras vezes no texto, mas seu nome é citado sequer na legenda que sustenta a foto:
O Ministério Público apura transações entre uma empreiteira que superfaturou uma obra em São Paulo, o publicitário Duda Mendonça e o ex-prefeito Paulo Maluf. Abaixo, a cópia de um cheque da empreiteira para Duda, no valor de 12 277 reais, por serviços que a empresa não explica. A suspeita é que a empreiteira pagou no caixa dois uma parte do que Maluf devia a Duda.
Pergunta-se:
Por que a revista, tão perspicaz e ágil em relacionar fatos e evidências para ampliar suspeitas, não toca no nome de Nelson Biondi?
Terá a omissão a intenção de preservar o cliente de Biondi nas eleições de 2002?
Algum jornal ou revista irá investir para aprofundar e contar a história com todos seus detalhes e personagens?
A segunda casca de banana está na reportagem auxiliar sobre lavagem de dinheiro, ‘Festa no exterior’, na qual várias personagens ilustres são alvo da perspicácia da revista. Dentre as várias celebridades, dois empresários aparecem em foto – Samuel Klein e seu filho, Michael, com a legenda ‘A família Klein, das Casas Bahia: movimentação de 1 milhão de dólares via offshore’.
Sem desmerecer a iniciativa da revista em levantar suspeitas sobre os controladores das Casas Bahia, a exposição dos empresários não provocou dilema de qualquer natureza na revista, mas o mesmo não pode ser dito dos jornais e das emissoras de televisão – foco dos investimentos milionários da rede de varejo. Dados da própria Associação Nacional dos Jornais de 2004 apontam a rede investiu US$ 235,1 milhões em publicidade nos jornais. Para se ter noção da importância desse investimento, o segundo maior anunciante em 2004, foi a montadora General Motors, com US$ 59,47 milhões, ou cerca da quarta parte da dinheirama despejada pela rede varejista.
Não foram encontrados na rede os números da bolada que as Casas Bahia investiram nas emissoras de televisão, mas pouco não foi: a mídia tevê abocanha quase metade do total investido pela rede varejista.
Com essa influência, torna-se mais fácil compreender porque os jornais e as emissoras de televisão mudaram de comportamento e não repercutiram as denúncias da revista.